sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Vamos ao circo...das greves?

As greves gerais são fenómenos ricos em peripécias e em factores de destaque. Podemos pegar nas greves e falar nos números, nos objectivos, nos resultados. Mas também podemos ter uma visão menos centrada, olhar em redor, e fazer uma análise da própria sociedade. Esta greve não foi diferente a tantas outras e aqui ficam 3 exemplos:
1-      Logo de manhã cedo o fenómeno da greve começou a ser explorado pelos meios de comunicação social. Numa reportagem em directo à porta da “Vimeca”, uma jornalista de TV mostrava-se ansiosa pela carga policial (que não ocorreu) para permitir a saída de autocarros em cumprimento dos serviços mínimos decretados pelo tribunal arbitral. Neste episódio, constatamos dois assuntos dignos de registo: 1- o jornalismo nem sempre é isento e procura acima de tudo as polémicas, colocando-se ao lado dos cidadãos, ainda que não tenham razão nos seus motivos (não dando espaço para o exercício do contraditório); 2- os piquetes de greve não perceberam que o direito à greve é tão legítimo como o direito a trabalhar e, para além disso, os serviços mínimos decretados por tribunal têm de ser cumpridos e sobretudo respeitados!

2-      À hora de almoço, passou na Av. 5 de Outubro uma comitiva do Bloco de Esquerda, encabeçada pelo seu líder. Eram não mais de 20 elementos que se faziam ouvir através de um tambor, alguns apitos e muitos gritos ou cânticos no limiar do insulto a quem decidiu exercer o direito a trabalhar. Entraram em supermercados, traziam bandeiras e coletes e mostravam-se bastante sorridentes. Para controlar ou para proteger esta comitiva, estavam patrulhados por cerca de 10 elementos da PSP, incluindo agentes de moto e de automóvel, num incrível rácio de protecção policia/cidadão de ½. (Assim compreende-se que o BE se queixe repetidamente de policias a mais ou de excesso de autoridade!)


 


3-      À noite, as reportagens de TV davam grandes planos da “carga policial na Assembleia da República”. Poucos jornalistas falaram no derrube de barreiras e na prevaricação de sujeitos que colocaram em causa a ordem pública e desobedeceram a ordens das forças de segurança. Dizia-se que era uma manifestação dos indignados. Mas indignados contra o quê? Se é contra o estado de direito e contra o respeito pelas instituições, eu reservo o direito de estar indignado contra os indignados!
Não sou um economista purista contra as greves nem contra a oportunidade das mesmas. O país está mal mas há vários policy mix que podiam ser utilizados em detrimento deste (e eventualmente até mais justos). Também não sou um ortodoxo das greves como único caminho à mudança de mentalidades e à alteração de procedimentos políticos. As greves devem existir mas os direitos de quem não quer fazer greve devem também ser respeitados!
Temos uma longa aprendizagem pela frente em matéria de conhecimento dos direitos mas também dos deveres de todos! O Governo deve dar o benefício da dúvida a quem protesta e quem faz greve tem de compreender a conjuntura, deve apresentar propostas, sugerir alternativas, ao fim de contas, ser proactivo.
Conhecer a vida real nunca fez mal a ninguém, assim como tentar perceber os mecanismos que estão por detrás das decisões políticas. Não há muitas pessoas no país em tentar compreender os dois lados e a fazer pontes. O bom senso não abunda na sociedade. Ouvimos falar em direitos adquiridos de um lado e na força dos mercados do outro. Mas poucos se lembram que no centro poderá estar a perspectiva correcta de um país mais equilibrado e de uma sociedade mais desenvolvida. Ninguém quer abdicar dos direitos mas a verdade é que desde o 25 de Abril já passaram 37 anos e o Mundo evoluiu. Por outro lado, o capitalismo selvagem também já demonstrou ser insustentável e os mercados não são o Eldorado!
Necessitamos de uma nova ordem económica que seja equilibrada entre os direitos e os deveres das pessoas, e que, ao mesmo tempo, consiga ser razoável para a sustentabilidade económica da sociedade. Um acordo desses é difícil de alcançar mas mais difícil parece ser a consciencialização dos agentes políticos, empresariais e sindicais para a necessidade de cedências, entendimentos e compromissos que mudem o cenário a que estamos infelizmente habituados em Portugal.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Subsídio de Natal e o copo meio cheio

No final deste mês muitos de nós vamos receber o subsídio de Natal. O que tradicionalmente era um mês especialmente interessante por vermos chegar à conta a massaroca em tamanho duplicado, este ano será de amargura porque a mesma sofrerá uma valente dentada por via da retenção na fonte de quase metade do subsídio.
Ao olhar para o extracto bancário, e depois de rogar umas pragas à geração de políticos incompetentes que nos tem governado, culpados pelo despesismo do Estado que nos conduziu à delicada situação financeira, tornando-nos um país endividado e cuja solvência é mantida apenas devido à intervenção de entidades europeias externas o comum português saberá, como sempre, dar uma resposta à altura: estoirar a massa toda em prendas de Natal!
Sem prejuízo da desorientação económica e financeira de que temos sido alvo nos últimos 20 anos, que moral temos para criticar os gestores e políticos pela governação dos recursos públicos se, colectivamente, adoptamos comportamentos igualmente insustentáveis na gestão do nosso próprio orçamento?
Apercebo-me que muitas pessoas canalizavam parte dos subsídios anuais (férias e Natal) para fazer face a despesas também anuais ( despesas com o carro, despesas escolares, IMI...). Mesmo com este corte, e apesar de sentir haver uma crescente sensibilidade para a importância da poupança, garanto-vos que nas vésperas de Natal ninguém vai conseguir meter o pé no Colombo!
Se é verdade que o consumo contribui positivamente para o crescimento económico também é verdade que o nível de sobreendividamento das famílias não é sustentável.
Nunca como agora as temáticas da gestão responsável do dinheiro, a importância da poupança têm estado tão na ordem do dia. As noticias sobre a proporção da crise que atravessamos e as assustadoras incertezas sobre o futuro económico do pais marcam a agenda noticiosa em Portugal. Como tal, espera-se para bem de todos, uma ainda maior racionalidade na gestão dos seus recursos e uma efectiva mudança de comportamentos no sentido de uma maior responsabilidade de consciência nas decisões de consumo. Havendo uma incerteza cada vez maior sobre os rendimentos futuros, esperava-se por essa via uma diminuição do consumo presente.
Sou dos que encara o valor de subsidio de natal como a parte meio cheia do copo. Admito convictamente que, a par de vários subsídios, este seja um dos que estarão em vias de extinção, pelo menos nos moldes em que são actualmente atribuidos. Não porque o país tenha empobrecido de repente mas por ter vivido acima das nossas possibilidades, nomeadamente à falta de planeamento provocado pelas baixas taxas de juro e facilidade de acesso ao crédito bancário de que beneficiámos desde a entrada na zona euros à cerca de 10 anos atrás.
Urge, neste contexto de incerteza, gerirmos eficientemente as nossas decisões de consumo e poupança tendo em conta uma perspectiva inter-temporal do nosso fluxo de rendimentos. Actualmente é especialmente importante poupar porque o rendimento disponível futuro é especialmente incerto, quer por via de aumento de impostos, quer pelo corte de subsídios, quer pela maior probabilidade de desemprego, quer pela redução do valor futuro das reformas, quer por muitos mais outros factores.
Por isso, meta o dedo no ar quem já tenha adaptado as suas decisões quotidianas ao novo contexto em que vivemos.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Um plano em 5 pontos para solucionar a crise da zona euro:

  1. O EFSF (European Financial Stability Fund) emite divida imediatamente. A nova divida emitida é comprada pelo BCE que para isso imprime a quantidade de euro necessária para garantir que o preço desta dívida seja igual ao da alemã.
  2. Com a receita da emissão de dívida o EFSF assegura o serviço da dívida de todos os países membros da zona euro que não conseguem emitir divida a um preço próximo do da dívida alemã.
  3. Em contrapartida, todos os países membros que beneficiem deste mecanismo asseguram um saldo primário de zero ou excedentário. Para alcançar este objectivo: A) parte substancial da despesa em proteção social é assegurada por um novo fundo de coesão europeu; e B) a despesa nas forças armadas é reduzida de forma draconiana. Para isso, as forças armadas dos vários países membros são incorporadas numa nova força militar da UE (financiada por um imposto sobre a transações financeiras tipo Tobin, 2% do PIB da UE é suficiente para financiar esta nova força militar comum).
  4. No periodo de um ano, organizam-se eleições para o Parlamento Europeu (PE), e o novo presidente da Comissão Europeia é eleito pelo PE. Os candidatos elegíveis tem que ser deputados ao PE.
  5. A idade de reforma aumenta para 69 anos em todos os países da UE.

Questão para os mais pragmáticos: que elementos deste plano são realizáveis (desejáveis) e quais não o são?

Paulo S. Monteiro

Smont.paulo@gmail.com

(comentários bem vindos)

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Secret (Negative Externality) Story

Certos programas de televisão deviam ter uma sobretaxa de imposto. Ligar a televisão a determinadas horas do dia pode ser um exercício de claro empobrecimento cultural e cívico. A linguagem é decadente, os comportamentos são reprováveis, a apresentação é de baixo nível e a aprendizagem é medíocre.
Assim, e num contexto de crise, porque tem o comum dos cidadãos de sofrer com aumentos de impostos ao mesmo tempo que programas de TV que têm um elevado nível de externalidades negativas podem passar impunemente na televisão generalista, sem serem taxados pelo seu impacto negativo nos telespectadores?
Estes programas representam custos externos dificilmente quantificáveis para a nossa vivência em sociedade. Quando ligamos a TV não temos um indicador que nos informe de quais os programas onde podemos aprender algo, os neutros ou os programas empobrecedores. Apenas escolhemos ligar ou não a TV e escolher o canal. Mas mesmo que um cidadão possa escolher apenas bons canais e programas mentalmente evoluídos, na sua vivência social quotidiana é confrontado com comentários, expressões, modos de vida e modas ditadas por esses programas mentalmente dementes.
Esse custo social, que não é eliminado pela respectiva autoridade reguladora, deveria ser taxado, sendo o subsídio avaliado com base no custo marginal associado à externalidade negativa do próprio programa.
E não pensem que estou a pensar apenas nos programas onde alguns cidadãos são metidos num galinheiro durante 3 ou 4 meses. Os programas que procuram escolher cantores, chefs, dançarinos, os programas de “celebridades” e até alguns tempos de antena deveriam ser alvo de uma taxa especial de imposto. Já que têm um custo para a sociedade, deveriam dar um contributo extra para essa mesma sociedade!
Seria uma medida acusada de colocar em causa a liberdade de expressão e muitos diriam também que seria um crime taxar os programas de tv com maior share de audiência. Mas a sociedade ficaria mais evoluída e o ciclo vicioso da mediocridade poderia dar lugar a um upgrade social com menos impostos a quem trouxesse externalidades positivas para a economia!

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Competitividade, a falácia dos políticos em tempos de crise!

Nas intervenções públicas efectuadas por diversos membros do Governo tem existido uma sintonia acerca da metodologia para resolução da crise económica e para a dinamização do tecido económico nacional: Competitividade!
Como economista de formação só posso concordar que a competitividade é fundamental para dinamizar um país onde foram cometidos erros grosseiros durante décadas.
Em qualquer empresa, a competitividade é uma palavra presente no léxico diário dos gestores e na estratégia das equipas de vendas e marketing. Mas o que é a competitividade? Agregando e simplificando as várias definições, não é mais do que a capacidade de colocar bens e serviços nos mercados a preços atraentes e qualidade similar com os restantes concorrentes. No sector público, a competitividade implicará uma racionalização das funções do Estado e uma redução dos gastos efectuados por via das receitas de impostos!
Mas a aposta na competitividade não é uma novidade para os portugueses. Os governos eleitos durante as últimas décadas utilizaram demagogicamente esta palavra para ilustrarem os objectivos das políticas que apresentaram ao eleitorado em prol do crescimento do país. Mas, tendo Portugal chegado à actual situação de dificuldades financeiras e insustentabilidade do modelo de desenvolvimento, ou a competitividade não foi suficiente para dinamizar o país, ou tem sido mal implementada….ou, na pior das hipóteses, não é por si, um modelo de desenvolvimento (o que contraria as declarações de alguns políticos e de muitos académicos).
A competitividade não pode ser um objectivo em si mas apenas a ferramenta estrutural onde se podem apoiar algumas decisões de políticas públicas. Para além da competitividade há outras ferramentas que não podem ser esquecidas: análise custo-benefício, análise comparativa histórica, avaliação de políticas públicas, comparação inter-regional, evolução demográfica, coesão…
Se ficarmos apenas pela competitividade, as desigualdades intra-geográficas vão seguramente aumentar: Continuaremos a apostar nas regiões onde existem empresas e a esquecer o restante território nacional. Com isso, mais pessoas deixarão as áreas desfavorecidas do interior e este ciclo vicioso não terminará!
A competitividade é uma estratégia que pressupõe algum equilíbrio inter-regional. Caso este equilíbrio não exista (como acontece no caso português), o Estado não deve abster-se da sua função de regulador. Não pode fechar os olhos ao país desfavorecido e apostar apenas nas indústrias do litoral. Necessita sobretudo de criar incentivos que fomentem a equidade regional, facilitando as mais-valias comparativas de cada nicho de mercado. Não é tarefa simples, principalmente num contexto de crise, mas nenhum membro do governo deveria ter a expectativa de um trabalho fácil na condução dos destinos do país!

Nuno Vaz da Silva
Economista

Este artigo foi publicado na edição de 02/11/2011 do jornal "Alto Alentejo" e pode também ser lido no blog Deseconomias