quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Não há ausentes sem culpas, nem presentes sem desculpas


Sob o pretexto de um qualquer estudo económico, numerosas medidas politicas têm sido tomadas em Portugal com impactos estruturais na vida de milhares de cidadãos e com alterações profundas no ordenamento do território. Não querendo colocar em causa a fiabilidade ou a veracidade dos estudos utilizados, nem sempre é possível agrupar num documento (e outras vezes é até pouco conveniente...) a total dimensão dos impactos económicos de uma determinada medida.
Deixo aqui exemplos de muitos similares disseminados por todo o país:
Com a Politica Agrícola Comum, a superfície agrícola explorada em Portugal reduziu cerca de 30% (em 1968 havia cerca de 5 milhões de hectares afectos à produção agrícola, número que reduziu para 3.5 milhões em 2007 – dados do Pordata). Pela lógica económica das vantagens competitivas, foi desincentivada a produção de pequenos e médios agricultores (muitas vezes através de subsídios) para que a produção cumprisse critérios de eficiência. Isso originou, entre outros, o abandono das terras, o aumento da superfície ardida e a fuga das populações para áreas do país industrializadas ou para outros países. Esse abandono das terras também ameaçou a produção de raças e culturas autóctones.
Outro exemplo são os serviços públicos como a educação e a saúde. Devido a critérios de eficiência, os governos decidiram fechar escolas e unidades de saúde em zonas do país que não cumprissem rácios estatísticos face à média nacional. Pelos dados do Pordata, em 1980 havia em Portugal cerca de 10.000 escolas do ensino básico e em 2013 não eram mais de 4.800. Já em relação às unidades de saúde, passámos de cerca de 460 em 1980 para 230 em 2012. Podíamos alegar que o número de camas de internamento tinha aumentado mas nem isso aconteceu. Em 1980 eram 51.000 e em 2012 não passavam de 36.000.
A concentração de serviços tinha como objectivo gerar economias de escala, poupando recursos ao orçamento do Estado. Essa concentração não teve em consideração os impactos das medidas como a perda de população no interior e a dificuldade em atrair profissionais qualificados para regiões em perca demográfica e com tendência para o subdesenvolvimento compulsivo.
Ou seja, os estudos económicos que protegeram decisões dos Governos, não consideraram as consequências das medidas apesar da Economia como ciência social não ignorar esses impacto: Externalidades e custos de oportunidade são conceitos amplamente estudados na teoria económica pela sua pertinência em qualquer decisão mas são igualmente incómodos quando podem afectar a lógica politico-partidária.

Com o abandono das terras ninguém parece ter pensado no que aconteceria aos terrenos nem aos agricultores depois dos subsídios. Com o fecho de escolas e unidades de saúde, ninguém se preocupou em definir políticas de fixação de populações e dinamização do tecido empresarial.
Há em Portugal uma crescente faixa de terreno esquecida e abandonada pelo poder central porque não produz, porque tem cada vez menos pessoas e porque isso significa menos votos. Os estudos económicos ignoraram que somos um pequeno país sem recursos minerais que não se pode dar ao luxo de abandonar mais de 50% do território para se concentrar apenas no litoral desenvolvido e populoso. Nem sempre a melhor decisão é a que parece ser mais eficiente no curto prazo.

Não se pode gerir um país no curto prazo apenas por estatísticas nem a economia pode ser a única justificação para todas as políticas estruturais de uma nação eficiente!


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