quarta-feira, 1 de junho de 2011

6 MoUtivos para criticar os candidatos e os media

Estas eleições legislativas antecipadas decorrem num contexto pouco habitual: Portugal está mergulhado numa crise económico-financeira, o primeiro-ministro demitiu-se e tivemos de pedir ajuda externa, temos obrigação de cumprir as medidas impostas pelo Memorandum of Understanding (MoU), e a recessão é uma realidade em crescimento.
Mas é extraordinário como, apesar deste contexto, na campanha eleitoral os assuntos são analisados apenas pela rama, evitando os mais estruturais e difíceis de implementar. Assim, proponho-me a identificar 6 temas que não foram ainda discutidos mas que são de grande relevância para a sustentabilidade do país:
- Privatizações: O Estado precisa de liquidez. Na ausência de receitas correntes, a troika deliberou que terão de ser privatizadas as participações em empresas públicas, nomeadamente TAP, Aeroportos, CP Carga, REN, EDP, Galp e Caixa Seguros. Mas, o MoU vai mais longe e indica que terão de ser inventariados e eventualmente privatizados determinados bens, incluindo imóveis, das autarquias. Alguém falou disto nesta campanha?
- Emprego: o MoU introduz medidas que afectarão directamente o emprego na Administração Pública (com a redução do número de funcionários e racionalização de serviços) e indirectamente, por via dos constrangimentos provocados pela recessão económica e pelas alterações aos códigos laborais. A taxa de desemprego terá tendência para aumentar e o recurso às empresas de trabalho temporário provocará um acréscimo do emprego precário. E que futuro reservam os políticos para os funcionários despedidos e para os jovens em inicio de carreira?
- Energia: o MoU prevê a liberalização dos mercados de electricidade e gás, terminando a actual regulação dos preços finais ao consumidor. Esta medida poderá ainda ser associada a um aumento da taxa de IVA de 6% para 23% - um aumento que muitas famílias e empresas poderão não conseguir suportar. Para além disso, poderá influenciar um aumento da taxa de inflação, pelo grande peso destes inputs nos orçamentos familiares e empresariais. Porque não se discute este tema?
- Habitação: a diminuição dos benefícios fiscais com juros e encargos de habitação própria terá impacto na redução do orçamento das famílias. Por outro lado, o aumento do IMI, a maior frequência das avaliações aos imóveis e a falta de liquidez no sector financeiro provocarão uma contracção na procura de casa própria. Haverá maior dificuldade na venda e compra de casa, o que originará a diminuição do dinamismo neste sector. E o que acontecerá às casas já construídas que estão para venda?
- Autarquias locais: O MoU prevê a redução do número de trabalhadores em 6% até 2014 e a diminuição do número de autarquias (actualmente 308, incluindo os Municípios das regiões autónomas), e Freguesias (actualmente 4259). Alguém sabe de que forma pretendem os partidos mexer no mapa autárquico? Quais os concelhos que serão extintos?

- Desenvolvimento Regional: O MoU não prevê a existência de medidas que potenciem o desenvolvimento regional, sendo este um tema tabu em todo o documento (à excepção da diminuição das transferências do Governo Central para as regiões em 175 milhões de euros). Tendo Portugal vários problemas crescentes de assimetrias regionais, espera-se que estes não sejam combatidos quando existem outras medidas de difícil implementação e com prazos muito apertados. Mais uma vez as vantagens competitivas das regiões do litoral vão levar a um agravar do problema das regiões do interior. E qual será então a situação das regiões desfavorecidas daqui a 3 anos?

Estes 6 temas não foram abordados na campanha nem foram objecto de perguntas nos debates. O serviço público de televisão ignora-os e muitos portugueses tomam decisões sem estarem esclarecidos.
Os candidatos também fogem destas matérias ou nem as consideram relevantes para obter votos. Provavelmente, se o fizessem, poderiam até perder alguns apoios. No entanto, estas questões vão estar na ordem do dia nos próximos 3 anos. E os portugueses terão de viver com os constrangimentos provocados também por estas medidas.
Se a campanha serve para informar os cidadãos, debatendo argumentos e se é subsidiada pelo próprio Estado, não deveria ser exigido aos partidos que esclarecessem realmente os cidadãos sobre como pretendem governar o país?

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