segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Secret (Negative Externality) Story

Certos programas de televisão deviam ter uma sobretaxa de imposto. Ligar a televisão a determinadas horas do dia pode ser um exercício de claro empobrecimento cultural e cívico. A linguagem é decadente, os comportamentos são reprováveis, a apresentação é de baixo nível e a aprendizagem é medíocre.
Assim, e num contexto de crise, porque tem o comum dos cidadãos de sofrer com aumentos de impostos ao mesmo tempo que programas de TV que têm um elevado nível de externalidades negativas podem passar impunemente na televisão generalista, sem serem taxados pelo seu impacto negativo nos telespectadores?
Estes programas representam custos externos dificilmente quantificáveis para a nossa vivência em sociedade. Quando ligamos a TV não temos um indicador que nos informe de quais os programas onde podemos aprender algo, os neutros ou os programas empobrecedores. Apenas escolhemos ligar ou não a TV e escolher o canal. Mas mesmo que um cidadão possa escolher apenas bons canais e programas mentalmente evoluídos, na sua vivência social quotidiana é confrontado com comentários, expressões, modos de vida e modas ditadas por esses programas mentalmente dementes.
Esse custo social, que não é eliminado pela respectiva autoridade reguladora, deveria ser taxado, sendo o subsídio avaliado com base no custo marginal associado à externalidade negativa do próprio programa.
E não pensem que estou a pensar apenas nos programas onde alguns cidadãos são metidos num galinheiro durante 3 ou 4 meses. Os programas que procuram escolher cantores, chefs, dançarinos, os programas de “celebridades” e até alguns tempos de antena deveriam ser alvo de uma taxa especial de imposto. Já que têm um custo para a sociedade, deveriam dar um contributo extra para essa mesma sociedade!
Seria uma medida acusada de colocar em causa a liberdade de expressão e muitos diriam também que seria um crime taxar os programas de tv com maior share de audiência. Mas a sociedade ficaria mais evoluída e o ciclo vicioso da mediocridade poderia dar lugar a um upgrade social com menos impostos a quem trouxesse externalidades positivas para a economia!

22 comentários:

Jose Lapalice disse...

És capaz de dar alguma luz sobre quais os critérios para aferir o impacto negativo de programas de TV na sociedade portuguesa? E de que cor deverá ser o lápis? Azul ou opta-se por outra cor?
Ps: Sei que ouves um pouco das discussões no Parlamento português. A ARtv devia estar na lista deste teu imposto.

Nuno Vaz da Silva disse...

Eu sei que não é facil aferir uma externalidade, principalmente quando é negativa. Por exemplo, não é igualmente facil taxar uma industria poluente que se situa num parque natural. Em deterimento do lápis azul, prefiro a taxa. Não há censura mas há um critério de nivel cultural. Não me parece socialmente pertinente existirem programas que preparam pessoas para o desemprego nem programas brejeiros, sexualmente censuráveis e educacionalmente mediocres. Concordo que a ArTV tem também sessões decadentes. Não me oponho que haja um provedor que decida taxar também alguns momentos desse canal. Imagino que me dirás que muitos cursos também preparam pessoas para o desemprego (como os programas de TV). Tens razão, mas nesse caso o Ministério e as Assembleias de Universidade deviam assumir a responsabilidade e contribuirem para a segurança social no acrescimo marginal de desempregados que formam em cursos inacreditáveis. Acima de tudo não podemos fechar os olhos à teoria dos incentivos como forma de regulação e de promoção de uma sociedade mais evoluida!

Jose Lapalice disse...

Portugal tem canais de tv e de rádio públicos. pagos por todos nós. o objectivo que tu queres, de programas de maior qualidade, tem de começar por aí. E basta analisar um pouco para ver que muito tem de ser feito antes de ir para a tua ideia drástica.
Ps: confesso que estou surpreendido com o teu discurso, que é mais próprio daquela esquerda que julga ter superioridade intelectual sobre os outros. Não há mal em haver programas brejeiros ou plenos de referências sexuais. O mal é muita da população ter um nível de escolaridade e de curiosidade intelectual que se satisfaz com isso. Não podes esperar que um programa como o Câmara Clara vá para prime-time, quando Portugal tem o nível de analfabetos funcionais que tem. Tens de resolver os problemas mais a montante. E claro, se um canal privado tiver interesse em ter um programa dedicado à vida sexual dos caracois, não deve ser mais taxado por isso. Isso vai contra o meu conceito de liberdade. Ps: continuo com a dúvida como se chega a esse suposto critério de nível cultural.

Jose Lapalice disse...

Por exemplo, eu acho que a poluição sonora devia ser mais taxada. E até podia incluir aqueles instrumentos musicais que fazem mais barulho: violinos, trompetes e outras coisas que dão cabo dos tímpanos dos vizinhos

Nuno Vaz da Silva disse...

Vou por partes:
1- Concordo que estas medidas deveriam começar pela TV pública.
2- Existem mais 2 canais generalistas que devem cumprir critérios (embora menos restritos do que os publicos) na escolha da programação, apesar de não serem publicos.
3- Se me disseres que certos programas têm interesse e não têm qualquer externalidade negativa para a sociedade sou eu que me começo a preocupar. Outra coisa é achares que não deve haver incentivos perversos que controlem um certo nivel minimo na difusão deste tipo de programas.
4- Eu sou trompetista mas não exerço esse hobbie em Lisboa por causa disso. Aliás, estou a pensar investir num silenciador para não provocar problemas auditivos aos meus vizinhos.
5- Acima de tudo, dado que existem externalidades na sociedade (positivas e negativas) porque não são tidas em consideração ou mesmo contabilizadas?

Anónimo disse...

Fiquei bastante desapontado com esta tua análise. A liberdade implica respeitarmos as opções dos outros mesmo que tenham efeitos negativos... Se começamos a taxar tudo o que consideramos negativo ou não gostamos, acabamos numa ditadura pois os gostos são diferentes. Conheço algumas pessoas altamente formadas e com carreiras de sucesso que acham relaxante e descontraem a ver a Casa dos Segredos e não me parece que daí venha mal ao mundo. Nem tudo tem de ser educativo e/ou informativo. Bocage era um génio e escreveu muita literatura brejeira e temos também as cantigas de escárnio e maldizer que fazem parte da nossa cultura e hoje são bastante valorizadas.

Nuno Vaz da Silva disse...

Em resposta ao comentário anónimo, parece-me que não poderemos sequer comparar o génio de Bocage (goste-se ou não da sua terminologia) ao baixo nivel intelectual e social de determinados programas. E eu só critico porque também já vi, nem que seja como forma de poder dizer que certas coisas deviam ter regulação! Ou não existe externalidade e portanto considera-se que a televisão deve passar tudo o que o seu editor considerar relevante, ou a entidade reguladora tem de regular por via da proibição (ou, menos radical, por via de uma taxa moderadora que incentive determinado tipos de conteúdos em deterimento de outros).
Não se esqueçam que é falso dizer que actualmente não há censura na TV. Claro que há! Há a censura silenciosa do editor, em quem a Administração confia os shares e algum bom senso. O problema ocorre quando os shares se impõem ao bom senso!

Jose Lapalice disse...

Exemplo concreto do que acho bem mais grave do que programas popularuchos na TVI: hoje, por volta das 12.20h, Antena 1. À vontade foram uns 3/4 minutos a ouvir uma entrevista responder em espanhol, sem ninguém se dar ao trabalho de depois traduzir o que foi dito.
Não vou alongar-me muito mais pois a tua ideia Nuno é demasiado deixada a um arbítrio subjectivo que ainda não percebi como seria feito. Se os programas cumprirem com as leis portuguesas, não devem ser taxados por eventualmente serem programas mais básicos (alguns são apenas aparentemente básicos como a Casa dos Segredos). O ser básico ou não também depende dos olhos de quem vê e da sua sensibilidade para analisar.

Nuno Vaz da Silva disse...

Nesse caso que exemplificas concordo que devia ser proibido. Em Espanha nunca uma coisa dessas se passaria, nem num canal privado. Por mim podem alterar todas as leis que são ineficientes e que permitem vazios legais. E devemos caminhar em direcção a um tipo de sociedade mais eficiente e baseada em incentivos (positivos ou negativos). A casa dos segredos é pior do que básico. É educacionalmente decadente. Mostra aos telespectadores um nível que não é compativel com a escolaridade obrigatória e que toca o limiar da podridão intelectual. Desconfio até que 99% dos jovens portugueses com 5 anos têm maior responsabilidade civica do que certos alpinistas sociais que por lá andam. As minorias devem ser respeitadas, claro. Mas trocar as partes pelo todo é um risco social e que ataca principalmente os jovens e posteriormente os menos instruidos. Parece-me que alguem devia regular isso!

Nuno Vaz da Silva disse...

Lembra-te que tu escolhes se queres ver a casa dos segredos ou o national geografic (por vezes a diferença nem é muita)! Se não queres taxas e se não queres que exista também regulação, não deviam empurrar (pelo menos) essa programação apenas para horários incompativeis com a visualização de conteudos por parte de crianças??
Filmes com bolinha vermelha só passam a horários tardios mas quando mudo de canal, a qualquer hora do dia, tenho de ver oscilações suspeitas debaixo de um lençol entre uma "allien" e um tipo todo pintado!! Como se não bastasse, a apresentadora explicita tudo o que lá se passou... Liberdade?? Isto é Libertinagem e não Liberdade!!

Jose Lapalice disse...

É triste admitir Nuno, mas não é só na América que é possivel ouvir respostas completamente ignorantes de rednecks. Por cá tb há mt ignorância. E claro que aquilo não espelha Portugal como um todo, mas não é fantasia. E digo-te, para quem goste de psicologia, os reality shows são excelentes. Claro que tens de ter a capacidade de te abstrair do lixo, mas ver a relação (ou chame-se antes a violência psicológica) da Fanny com o João M. é algo muito interessante.

Jose Lapalice disse...

Nuno, o meu sobrinho com 10 anos já andava a trocar fotos da Penthouse com os amigos pela internet usando o Magalhães. Com tantas novelas, morangadas e afins, nada do que se passa naqueles lençois é novidade para os petizes.

Nuno Vaz da Silva disse...

É o quer te digo, muitas pessoas não vêem aquilo como lixo ou como um case study mas sim como a vida real da sociedade ideal. Há pessoas que se visualizam nas acções de determinados concorrentes ou nos comentários dos familiares. Desconfio até que alguns utilizam as poupanças para pagar viagens até à venda do pinheiro mas façam cortes nas despesas de farmácia. Insisto que estas novelas da vida irreal deviam ter taxas para passar na tv generalista e uma sobretaxa agravada por passarem em horário "nobre". Eu (assim como tu) sei distinguir as mensagens que me entram dentro de casa pelo sinal de TV mas acredita que muita gente não o sabe. Fechar os olhos a isso devido uma suposta liberdade de imprensa (que não existe) é maquilhar o problema e não querer olhar para a solução!

Abel Carreiro disse...

Ou podem fazer como eu.
Recuso-me a ver um segundo sequer disso...disso e daquela coisa sem explicação, e sexo indefinido, que de vez em quando pulula pelos ecrãns das televisões.
Pode um País em que estas "coisas" fazem sucesso, ter ele próprio sucesso?
Eu acho que não.

Hugo Pinto Correia disse...

Nuno, é o primeiro artigo que leio teu e discordo totalmente contigo neste ponto. Quem é que vai dizer o que é que eu posso e não posso ver? e já agora porque parar na TV? de certeza que há montes de livros de péssima qualidade, filmes muito maus, programas de rádio de mau gosto, blogs com opiniões estranhas ou pouco 'educativas'. Podemos proibir (ou taxar) os livros de banda desenhada para fazer com que as crianças leiam livros 'próprios. A tua proposta abre um precedente altamente perigoso que iria por em causa a liberdade de toda uma industria.

Nuno Vaz da Silva disse...

Obrigado pelos comentários. A existência de uma entidade reguladora para a comunicação social foi bem aceite por todos os espectros politicos. Isso aconteceu porque de facto é necessário existirem limites ao audiovisual por diversos motivos. Não sei se sabem mas as televisões deixaram de passar noticias de suicidios na ponte 25 de Abril porque se chegou à conclusão que essas noticias tinham efeito contágio (nos dias seguintes à noticia, havia vários outros suicidios na ponte). Identico caso aconteceu em relação aos incêndios há 2 ou 3 anos. As televisões generalistas decidiram também deixar de dar imagens em directo de chamas e de fazer reportagens que propiciavam (segundo concluiram) a existência de mais incêndiários.
Não sei porque é o caso que abordo no artigo diferente ou mais limitador da liberdade. Mas aceito as criticas e agradeço os vossos pensamentos sobre o assunto!

Hugo Pinto Correia disse...

A ideia que tenho (e posso estar errado) é que as regras da ERC são feitas em auto-regulação. Ou seja a ERC propõem algo aos operadores de TV e se for aceite por todos passa a ser uma norma de conduta mas não uma lei. Nao sei se um acordo desses seria possível ou desejável para restringir determinado tipo de programas.

Nuno Vaz da Silva disse...

Eu penso que seria desejável mas admito que não é de implementação simples ou mesmo unanime. De qualquer forma, não devemos escrever apenas sobre os assuntos banais. Faz falta haver mais pessoas que colocam o dedo na ferida e que se questionem sobre temas que sempre foram dados como adquiridos! O mesmo se aplica aos vossos comentários. Se ninguém comentasse o artigo não teria tido a mesma amplitude. A existência do contraditório é fundamental para uma maior eficiência da democracia!

Jose Lapalice disse...

Faço aqui um mea-culpa. Agora já vi uma virtude desta tua ideia Nuno. Vai criar mais postos de trabalho. Ok, seriam postos de trabalho talvez com nomes menos nobres como inquisidor, delator, censor. Mas pronto, tudo a bem de menos kitsch nos orgãos de comunicação portugueses. Nuno, meter o dedo na ferida é uma coisa. Falar de ideias próprias de ditaduras acho que não deve ser uma prioridade. E quanto a isso das TVs não falarem de suicídios na Ponte Oliveira Salazar, não sei se é bem assim. Mas para estender essa lógica, então não deviam tb dar notícias de violadores que estão fugidos à justiça, agressores domésticos que escapam impunes ou banqueiros que dão desfalques de milhões de euro e não lhes acontece nada.

Nuno Vaz da Silva disse...

Por algum motivo as tvs não dão filmes pornográficos ou de terror a meio da tarde. Numa sociedade sem qualquer limitação, como pareces defender, ou seja uma anarquia, não teria de certo nenhuma limitação. Não me parece ser a melhor opção, embora a democracia como existe não seja também eficiente nem promova tendencialmente uma equidade social( ou pelo menos de decisão).
Para complementar, parece-me perfeitamente razoável colocar limites à "bad information" sempre que esteja relacionada com o aumento de criminalidade ou com comportamentos sociais reprováveis.
É limitador da liberdade? Talvez...mas afinal o que é a democracia senão um sistema de controlo da liberdade em função de leis??

Jose Lapalice disse...

Claro que há leis que têm de ser cumpridas. E escalões etários para certos programas/filmes. E são cumpridos (mais ou menos). Já sobre imagens de guerra, torturas, assassinatos e afins, dão a qualquer hora do dia, inclusive nos média públicos. Como já referi, a lei deve ser cumprida. Agora o que tu queres é uma lei comprida e extraordinariamente castradora da liberdade e de implementação completamente dúbia e arbitrária que ainda não percebi em que critérios se basearia. Ps: Não tenho dúvida em saber o que é mais chocante: ver imagens de guerra (como na Líbia) ou de uma senhora voluptuosa pedir ajuda a um canalizador para lhe tratar dos canos.

Nuno Vaz da Silva disse...

Não contive o sorriso ao ler o teu PS. Não necessitamos de uma lei comprida, basta que seja cumprida e esteja adequada aos tempos que vivemos. Não vejo razão para não haver regulamentação do tipo de programação e imagens caso seja detectada a existência de correlação positiva entre a reproduçãode imagens violentas ou de determinados crimes e o seu aumento na sociedade. Não me importo de abdicar de um ou dois graus de liberdade para viver mais seguro e numa sociedade mais culta e evoluida. Reproduzir até à exaustão o pior que temos sem mostrar o melhor que somos só nos vai bloquear e atrasar.
Eu sei que gostavas que Portugal fosse uma sociedade mais desenvolvida e com menos broncos. Será que uma regulamentação com bom senso da TV não poderia ajudar nesse ambicioso caminho? Não digo para acabar de vez com os programas estupidos e inuteis. Mas temos de criar incentivos para que a programação das tvs generalistas seja menos animalesca e mais humanizada.