terça-feira, 10 de abril de 2012

Corte de subsídios – Um bom argumentário internacional, uma má decisão nacional!

A decisão do não pagamento dos subsídios de férias e Natal aos funcionários públicos e aos funcionários de empresas públicas arrisca-se a ser uma das maiores injustiças sociais do país! Esta opção de política governamental viola princípios de equidade e de ética pública!
Como muitas outras decisões políticas, o corte de remunerações deveu-se a uma escolha. Em detrimento de cortar os subsídios apenas aos funcionários dependentes directamente ou indirectamente do Estado (a que vou apelidar de funcionários públicos), o Governo poderia ter optado por tributar os subsídios de forma equivalente entre funcionários públicos e funcionários não públicos. Essa tributação, à semelhança do que foi efectuado em 2011, poderia ter a forma de uma sobretaxa de imposto, com vista a obter para os cofres do Ministério das Finanças, a soma necessária ao cumprimento do Memorando de Entendimento com a Troika. Esta opção, não escolhida pelo Governo, alcançaria o mesmo objectivo orçamental da hipótese implementada, com mais equidade social.
Claro que os funcionários não públicos estão satisfeitos com a opção do Governo. Mantêm o seu rendimento habitual, à medida que uma franja da população (que não a sua) contribui para o pagamento da divida pública. Mas imaginem como se sentem os funcionários públicos quando vêem os seus rendimentos reduzidos em pelo menos 1/7. Serão eles os únicos responsáveis pelos sucessivos e galopantes deficits orçamentais? E, mesmo que não sejam eles os responsáveis, terão sido eles os únicos beneficiários dessa despesa pública?
Não tenho dados para opinar numa ou noutra posição mas parece-me que todos os cidadãos, (funcionários públicos, privados, desempregados e beneficiários de programas de inserção) serão responsáveis e beneficiários pelos deficits do Estado. Todos os cidadãos beneficiam das Estradas, das Escolas, das Forças Armadas, da Administração Pública, dos Hospitais e da Justiça. Podemos dizer que algumas destas Instituições funcionam mal mas nenhuma delas existe apenas para os funcionários públicos.
Então, como se explica que o Governo tenha optado pelo corte dos subsídios públicos?
É simples! Por uma questão de argumentário politico-orçamental. Com o corte dos subsídios, o Governo reduziu a componente de despesa orçamental. Se optasse pela tributação dos subsídios de todos os cidadãos, a despesa manter-se-ia mas tinha um aumento da receita por via do aumento dos impostos. Desta forma, junto das instâncias internacionais, passou-se a imagem de que Portugal conseguiu reduzir o deficit pelo lado da despesa. Na prática, alcança-se o mesmo objectivo de obtenção rápida de fundos, com o mesmo impacto orçamental. Apenas os visados são uma percentagem menor de indivíduos com uma carga acrescida… Trata-se portanto de um mecanismo de ajustamento que revela falta de equidade social.
Esta questão torna-se ainda mais difícil de explicar nas empresas de capitais públicos. Os salários dos seus funcionários não saem do orçamento público pelo que a retenção desses subsídios terá efeitos sim, mas nos resultados líquidos das respectivas empresas. Essas empresas, ao contrário da Administração Pública, competem em mercados concorrenciais e com outras empresas não publicas cujos funcionários não sofreram cortes ou retenções supostamente orçamentais…
A opção política pela diminuição do deficit pelo lado da despesa pode ter sido uma ferramenta útil de negociação internacional para o Governo. O difícil é afirmar que se tratou de uma boa decisão política quando a equidade social é colocada em causa face a um desígnio que deveria ser nacional: a solvabilidade das nossas contas públicas!
A discussão sobre o eventual regresso dos subsídios dos funcionários públicos em 2013 ou 2014 tem pelo menos um ponto positivo para o Governo: Altera a abordagem e a análise de comentadores e órgãos de comunicação sobre um tema sensível, incómodo e difícil de explicar… É mais fácil pedir desculpa por um erro na data anunciada para regresso dos subsídios do que explicar aos “funcionários públicos” porque pagam apenas eles pelos erros que todos, enquanto nação, deveriam assumir!

22 comentários:

Jose Lapalice disse...

Qual a equidade social no facto de um funcionário no privado poder ficar sem emprego, ao passo que o funcionário público tem emprego garantido? Qual a equidade social entre os que têm de gramar com o SNS e os funcionários públicos que têm a ADSE? E podia continuar por aqui a fora.

Para este assunto, o caminho da equidade social não cola no argumentário do funcionário público. É que não só não cola, como é ofensivo à inteligência.

Jose Lapalice disse...

Aliás, era útil poder fazer-se uma contabilização em 2014 acerca do número de "funcionários públicos" que sairam de empresas públicas para outras empresas concorrentes. Estou mesmo, mas mesmo, à espera de uma grande debandada de talentos.
Ou também dos funcionários públicos que face a estes cortes se despediram e tiveram de emigrar para pagar as suas contas.

Era interessante.

Nuno Vaz da Silva disse...

O que pretendes dizer é que muitos funcionários públicos deveriam ser despedidos e resolviamos dessa forma o problema orçamental?
Saberás por ventura que os funcionários de empresas publicas podem ser despedidos à semelhança da sector privado e que esses funcionários têm de recorrer ao SNS porque também não têm ADSE?
E será ainda que essa vantagem que advogas dos funcionários dito públicos face aos funcionários do sector privado é de pelo menos 1/7 dos seus (muitas vezes modestos) ordenados?
Ou quererás ainda dizer que o problema dos galopantes déficits se deve apenas a esses funcionários públicos, onde obviamente há bons e maus trabalhadores?

Jose Lapalice disse...

1ª pergunta: sim, ajudaria a resolver o problema orçamental. como é óbvio. Como qualquer empresa tem de fazer quando tem de reduzir custos, tem de reduzir pessoal.
2ª: e a maioria das empresas públicas não tem seguros de saúde privados? Até ao momento, o número de funcionários de empresas públicas que foram despedidos é diminuto (pela informação que vou acedendo). E do que me vou lembrando, nunca vejo muitos anúncios de recrutamento para empresas públicas. Devem ter outros métodos para recrutar...passa a palavra talvez. é um palpite.
3ª: ai é bem mais do que 1/7 do ordenado. Essa garantia de não ser despedido. Não tenho nenhuma dúvida.
4ª: Mas quando é que eu disse que era apenas??? Agora que são parte do problema, são.

Nuno Vaz da Silva disse...

Em relação à primeira resposta concordamos e deixa lá ver se não acontecerá. Eu preferia que se redefinisse toda a administração publica e se criasse um modelo de administração optima e racional e todas as alterações que fossem efectuadas tivessem esse optimo como objectivo.
Passando directamente para a ultima resposta. Se não são apenas esses funcionários a fonte do problema, porque terão de ser apenas eles a fonte da solução?
Há aqui uma incongruência de argumentação que não compreendo e que só consigo justificar pelo lado orçamental que contraiu com esta injusta medida politica!

Jose Lapalice disse...

Existem 3 grandes blocos de despesa que urge atacar de repente: custos com salários, custos com despesas sociais e encargos com PPP's.

Foi-se para os 2 primeiros, quase à bruta, dizendo que era temporário e sem nenhuma estratégia. O terceiro, não se fez nada passados 9 ou 10 meses.

Obviamente que toda a administração pública precisa de ser modificada, racionalizada, optimizada. Mas já viste sequer alguma ideia para tal?

No imediato, são necessárias acções. E era inconcebível não afectar os funcionários públicos. Eu pessoalmente defendia despedir funcionários públicos ao invés destes cortes da forma como foram feitos.

Nuno Vaz da Silva disse...

Concordo contigo quanto às PPPs e ao facto de as negociações ou estarem atrasadas ou não se saber nada sobre essa necessária renegociação das rendas.
Eu não digo que os funcionários públicos não deviam ver os seus salários reduzidos. O que eu digo é que é equitativamente injusto que apenas esses funcionários sejam taxados por via de um não pagamento de 1/7 dos seus vencimentos (e em alguns casos, de 2/7 dos seus vencimentos)
Mas concordo que a Administração Pública e a forma como se contratam os colaboradores devem ser alvo de uma profunda revisão!

Jose Lapalice disse...

Até me esquecia da equidade da progressão automática de carreiras. Onde é que isso existe no privado? Admite-se que alguém que faz basicamente o mesmo que alguém que está em início de carreira ganhe praticamente o dobro do salário só por "ter mais anos na função"?? Onde está a equidade e racionalidade nisto??

Ps: os FP não estão a ser taxados. Estão a ser cortados.

Nuno Vaz da Silva disse...

Taxa ou não pagamento vai dar ao mesmo: significa menos rendimento para (algumas) as famílias.
Em certas empresas publicas, essa progressão automática não existe.
Mas porque não atacamos essa falta de equidade e de racionalidade?
É que não me parece razoável que um árbitro marque um penalti falso contra uma equipa só porque cometeu um erro anterior de marcar um penalti contra a outra equipa.
Esta espiral de erros tem um final incerto, irracional, perverso e desincentiva a motivação e a eficiência dos cidadãos!

Jose Lapalice disse...

Em certas empresas públicas também não houve excepções. Existem adaptações. Coisas que desmotivam os restantes funcionários públicos.

Eu sei porque não se atacam estas irracionalidades. Porque ao invés de se falar em combatê-las, se fala em aumentar impostos para todos de modo a sustentá-las. Para muitos, nunca se conseguem ver desperdícios. Só falta é dinheiro.

Nuno Vaz da Silva disse...

Penso que o corte dos subsídios foi para todos. A redução de nos ordenados é que foi transformada em outras formas de contenção de custos. Afinal de contas, o efeito no orçamento é idêntico!
Mas eu concordo com a tua opinião sobre as irracionalidades. Não podemos é esquecer a irracionalidade da medida e do argumento a que levou à redução salarial apenas dos "funcionários públicos" para pagar uma divida que é de todos!

Jose Lapalice disse...

A dívida é de todos, não há dúvida. Mas foram os interesses corporativos de alguns (funcionários públicos) que fizeram Portugal chegar ao ponto em que está nas despesas com pessoal. Qual o trabalhador no privado que era e é contra o fim do "direito adquirido" de não se poder despedir na função pública?

Ps: Até te fica mal. Sendo tu do interior e conhecendo a realidade fora do círculo da elite de Lisboa, insinuar que são apenas os funcionários públicos que estão a sofrer reduções salariais. Muitos mais milhares sofrem reduções bem maiores. São despedidos. O seu rendimento desce 7/7 se nem sequer tiverem direito a subsídio de desemprego.

Nuno Vaz da Silva disse...

Interessante essa tua perspectiva. Mas provavelmente, dado que temos um grave problema com as rendas das PPPs, talvez defendas também o corte dos subsidios dos funcionários das empresas parceiras.
Por ser do interior e conhecer várias realidades é que compreendo onde é que o Governo quis chegar mas isso não me impede de, em consciência, alegar que foi um profundo erro colocar o ónus da resolução do problema nos funcionários públicos e das empresas públicas.
Por muito que tentes não consegues imputar a responsabilidade sobre os erros cometidos nesses mesmos funcionários.

Bem sei que esses problemas acontecem. Conheço-os de perto! Mas isso não inviabiliza a minha análise genérica, macroeconómica e sobretudo com espirito de corpo social que deveria ter o nosso país!

Pedro Antunes disse...

O problema que se quer resolvido é o da despesa pública (os privados conseguem a muito custo tratar da deles com mais eficiência). Esta despesa pública tem 3 componentes (sendo o pagamento da dívida o 4): os serviços públicos a que o estado está obrigado (SNS, etc); os funcionários que tem para os executar; e os encargos das obras que se fazem (em teoria) para permitir a existência dos serviços públicos (hospitais, escolas…).
Todos os 3 segmentos têm de ser atacados…

Claro que o português não FP está a ter cortes maiores indirectos: os serviços do estado estão a ser reduzidos, algo a que um FP que ganha o dobro sente muito menos… tem ADSE e mais cash. O IVA subiu, o que para um salário de 770 euros é desproporcionalmente mais pesado. Em toda a linha o português médio está a sofrer com uma base salarial de menos de 11 mil euros por cabeça… coitado do FP que tem de sofrer o mesmo com 18 mil euros (já com o corte de dois meses).

Mas quando temos 700 mil funcionários públicos a 1500 euros de média por mês por cabeça, uns módicos 15 mil milhões (se as contas não me falham) por ano, cortar 2 mil milhões de euros é justo. São 14 portugueses por funcionário!!! E já que estamos em situação de emergência nacional a escolha seria entre despedir 120 mil funcionários ou cortar-lhes 1/7 do rendimento. Como não se vê FPs a fugir para o privado é de esperar que continuem a achar a sua situação melhor do que anteriormente, pelo que na opinião (reflectida nas acções) os FPs eles concordam que foi a melhor escolha. Já agora acabar com a ADSE era outra coisa que se podia fazer de um dia para o outro com algumas poupanças.

Os encargos nas obras (como as ppp), as empresas participantes não têm qualquer culpa… Então o estado foi incompetente da negociação, não acautelou os seus direitos… deixou-se ser abusado como se não fosse o maior actor na economia portuguesa… e queres penalizar os empregados das empresas que a única coisa que fizeram foi aproveitar-se? E claro que o estado agora tem de renegociar todas as questões relacionadas com ppps… e vai acabar por o fazer. Rejeito a ideia que 9 meses é suficiente para essas questões, tão opacas na forma como foram criadas e mais opacas na forma como a legislação nacional as "gere".

Nuno, a redução dos salários dos FPs não é responsabilizar os FPs… é uma medida de gestão inevitável. Cobrar aos outros portugueses, em média mais pobres, pela incompetência do estado é que seria injusto!

Já agora não esquecer uma questão prática: com alguma facilidade, quem pudesse (tipicamente pessoas com mais posses), passava a não ter salário tributável em Portugal…

Nuno Vaz da Silva disse...

Estamos claramente em desacordo e tenho pena de não ter outros comentários de pessoas que compreenderão melhor esta situação por estare, no sector público ou em empresas públicas.
Mas refuto por completo a falácia de que os funcionários anteriormente descritos mantêm um status quo superior à média e que isso se analisa pelas reduzidas passagens do publico para o privado.
Qualquer um de vós consegue perceber as dinamicas conjunturais do mercado de emprego pelo que rejeito a argumentação demagógica utilizada para ilustrar a situação desses trabalhadores.

Pedro Antunes disse...

"Mas refuto por completo a falácia de que os funcionários anteriormente descritos mantêm um status quo superior à média e que isso se analisa pelas reduzidas passagens do publico para o privado." - Não precisas de olhar para as passagens do público para o privado… basta olhares para os salários médios, para as regalias que têm (horários, avaliações, ADSE,…). Que mais precisas?

Jose Lapalice disse...

Eu por mim não preciso de mais nada. As evidências falam por si.

Jose Lapalice disse...

"Por muito que tentes não consegues imputar a responsabilidade sobre os erros cometidos nesses mesmos funcionários."

Ai não? E que tal referir as greves que os funcionários públicos fazem. Ou os protestos? A pressão que fazem. A FENPROF por exemplo não tem nenhuma responsabilidade, pois não?

Quanto à pergunta se sugiro que sejam cortados os subsidios dos funcionários das empresas parceiras nas PPP's, claro que isso não tem nenhum sentido. Os funcionários da Mota-Engil, do BES, ou da Brisa não têm nenhuma influência no modo como os contratos foram feitos. Os administradores sim, têm. Mas descansa, que se o Estado fizer ajustes, estas empresas privadas farão por reduzir custos com pessoal na maior proporção possível, de modo a maximizar a sua rentabilidade.

Nuno Vaz da Silva disse...

Pedro, como dizia um professor meu, a média é um indicador muito arriscado para tirarmos conclusões. E, dizia ele, "se eu tiver a cabeça no forno e os pés no congelador, em média estou com uma temperatura amena mas na prática estou morto!" Os salários médios e as regalias médias não são genéricas. E, se há exageros, não deveriamos atacar esses exageros em vez de incidir os sacrificios na generalidade?
La Palice, saberás tu que a maior parte dos funcionários públicos não faz greve e muitos dos que fazem sã obrigados a isso por não terem alternativas de transportes? E saberás ainda tu que a maioria dos funcionários públicos não é sindicalizado?
Eu gostava que conseguissem analisar este problema e a sua solução de forma alheia ao impacto que o corte de subsidios não teve nas vossas carteiras. Compreendo o lobby do sector privado (aliás, que deu resultado) mas que a medida é injusta socialmente, desculpem mas isso é!

Pedro Antunes disse...

Nuno, vai ao estudo sobre rendimentos do FPs e verás que a proporção dos mesmos abaixo dos 1500 não é muito grande… tal como não o é acima. Os exageros devem ser atacados porque são exageros… mas não é com isso que reduzimos défice e dívida. Independentemente disso a média para os privados é feita da mesma forma, pelo que os valores são comparáveis.
Os privados têm vindo a cortar… e não começaram em 2007, já o vêm a fazer desde 2001 os mais precavidos). O que é socialmente injusto é andarmos a financiar 300 mil FPs a mais e para isso andar a cortar nos serviços do Estado. O que é socialmente injusto é aceitar estes 300 mil FPs a mais, mas o Estado não pagar a empresas que são viáveis se o Estado pagar a tempo e horas… mas vão falir porque nem o IVA se pode fazer por acerto de contas!!!

(Já agora podemos discutir se são 300 mil ou 100 mil a mais, mas não é esse o ponto relevante)

Jose Lapalice disse...

Nuno, tudo o que o Pedro Antunes refere eu subscrevo.
Nunca pensei que vivesses no mundo da lua, pensando que os privados não têm vindo a diminuir os seus rendimentos.

Quanto ao FP's serem obrigados a fazerem greve por não terem alternativa de transportes, isso são tretas. Claro que podem ir de carro. Não tão é para isso, porque sabem que não existem consequências para a sua falta. Quem trabalha no privado arranja sempre mais facilmente alternativas. Porque será....

Anónimo disse...

Sim, acho que se devem tributar apenas e só os funcionário públicos.
Porém, quando tiveres doente, vai ao particular, não vás ao centro de saúde incomodar esses funcionários.
Quando fores roubado, burlado, furtado, já sabes, desenrasca-te. Ou esperas que estes profissionais façam o mesmo que faziam quando recebiam os subsídios?
Afinal, não roubaram nada que seja deles nem do pai deles.