quinta-feira, 3 de maio de 2012

Ter um pingo de decência…

Li o editorial de Pedro Santos Guerreiro, "Anatomia de Um Golpe". Andava a ser partilhado por imensas pessoas no Facebook. Quando o li fiquei admirado com a forma e conteúdo deste.

Corrijam-me se estiver errado, mas:

1. Tanto quanto se sabe não houve negociação com os produtores acerca desta promoção. Por acaso no dia 1 de Maio estive com algumas pessoas do lado dos produtores e nenhum deles teve conhecimento prévio desta promoção, nem tão pouco houve compras com descontos forçados ao produtor.

2. Margens de 100% existem na distribuição. Só quem nunca trabalhou no meio ou não vai regularmente ao supermercado é que não sabe disso. 

3. Para concorrência desleal é preciso um acto continuado e não uma promoção esporádica e o Pedro Santos Guerreiro devia saber disso. 
Onde está o descontentamento destes comentadores nos descontos de 75% do Continente, que ainda por cima são regulares e muito mais passíveis de distorcer a concorrência do mercado… Qualquer aluno do segundo ano de economia sabe que para abuso de posição dominante é preciso: A - Ter uma posição dominante; B - Actos continuados e sustentados. 
Um acto de isolado venda a margens negativas (que não é o mesmo que dumping) não é abuso de nada. Também se tem vindo a assumir que o Pingo Doce vendeu a margens negativas. Eu não acredito nisso. Um bom artigo de ler e também já bastante partilhado no Facebook é o "Estive no Pingo Doce, paguei 50% e sobrevivi!" (escrito pelo economista Pita Barros).

4. O Pingo Doce já era um discounter. Quem trabalhou alguma vez na área de distribuição sabe disso, distribuição e produtores.


5. Cenas lúgubres só foram vistos por quem tem a barriga cheia… para os outros foi um mês ou dois de bonança.


6. Já se viu violência idêntica nas estreias do livro do Harry Potter, do último Iphone e vestidos de noiva pelo mundo todo, pelo que nada de anormal se passou. Vê-se o mesmo em jogos de futebol, concertos, manifestações. O facto de ter acontecido por causa de um desconto torna isto especial? Ou é a questão do dia 1 de Maio? Ou ainda a arrogância dos que já se pelaram por um Ipad e consideram que fazer o mesmo por comida não é "digno"?


7. Riemen, Tocqueville, Gasset… over think much?! Pedro Santos Guerreiro, como outros comentadores, acham mesmo que faz sentido ir por aí?


8. Os valores de Alexandre Soares dos Santos estão reflectidos no texto do funcionário do Pingo Doce, Adriano Pinto, que anda a circular pelo FB (interessante, e o perfil FB até é verdadeiro). Vejam. O texto dele explica muito como é que diferentes atitudes podem trazer ou destruir valor.


9. "uma humilhação"?? Que falta de sentido! Muitas foram as lojas do PG em que, apesar das longas filas e demora, tudo correu na normalidade. 50 intervenções da PSP (se assumirmos 1 hora por intervenção) em 360 lojas abertas 8 horas… é menos de 2% de incidência!!! O normal nesse dia foi demorar mais a comprar, não foi a anarquia! Alguém se deu ao trabalho de ver, num dia normal, quantas as intervenções da PSP em todos os Pingo Doce?

Corrijam-me se estiver errado, até por que estou a concordar com Camilo Lourenço (que vejo sempre a sobre-simplificar os assuntos) no seu artigo "Sem Pingo de Juízo", mas passar dois dias a discutir isto e chegar ao ponto de ir buscar Riemen Tocqueville, Gasset ou Espinosa… 

Tudo isto me parece escrito com uma tal falta de decência e honestidade intelectual… que tive de escrever este texto.

28 comentários:

Unknown disse...

Lá venho eu discordar, só para animar a discussão ;-).

Desafio-te a espreitar os resultados do Q1 da JM (http://www.jeronimomartins.pt/media/446401/resultados1t2012.pdf) onde podes constatar que a empresa não opera com margens de 100% - anda à volta dos 22%. E ambos sabemos que a JM não foge aos impostos, não é?

Depois há a questão mais chocante, que é a do "statement" político. Ignorar que há uma tomada de posição sobre o 1º de Maio é esquecer a história recente. Reconhecê-lo, achando que não faz mal um gestor usar a sua empresa para manifestar essa posição, é prescindir da separação entre o poder económico e o poder político sem a qual a democracia morre. Não quero ser ingénuo, essa promiscuidade existe. O que se passa é que é difícil denunciá-la, prová-la. Quando é tão flagrante como neste caso, não a podemos deixar passar em branco. Sob pena de nos custar muito mais do que encher a despensa para três meses.

Desculpa o cometário demasiado longo. Um abraço amigo,

Unknown disse...

Só agora vi que não é o Nuno o autor, daí o tratamento por tu. As minhas desculpas.

Pedro Antunes disse...

João, podes-me tratar por tu sem problemas! :)

Os resultados da JM podem operar com margens a 22%. O Pingo Doce pode, e tem, variados produtos com margens superiores a 100%. São negócios distintos, apesar de uma ser participada da outra. O Pingo Doce contribui, de acordo com o BESI e outro banco que agora não me recordo, para 4 a 5% da JM, pelo que os 22% pouco dizem sobre as margens do PG.

O 1º de Maio é o dia do Trabalhador. Isso não é um statement político… Não me parece que o Pingo Doce tenha feito esta acção de marketing no dia 1 de Maio por um qualquer statement político… fizeram porque: 1) era feriado; 2) sabiam que ia dar publicidade; 3) andavam a perder a guerra de preços; 4) NINGUÉM estava à espera.

Mas já agora, o facto do dia do trabalhador ser feriado em nada o torna sacrosanto ou intocável. Não me chocava terem acabado com o 1º de Maio como feriado em vez do 5 de Outubro. Muitos mais "Dias do/a" existem, com mais importância (dia da criança por exemplo, e não são feriados… Porque é que este dia tem tratamento diferente?

Jose Lapalice disse...

Só uma pequena dúvida. Eu não sei a que dizem respeito esses 4 ou 5%. Mas vendo o relatório de contas da Jerónimo Martins para 2011, vê-se que 26,7% do EBITDA veio do Pingo Doce. Assim como as vendas do Pingo Doce representaram 29,1% do total de vendas da JM.

Nuno Vaz da Silva disse...

Sinceramente não sou adepto de discutir percentagens porque podem ser enganadoras e todos sabemos que a contabilidade pode ser (não digo que é, mas pode ser) muito criativa!
Neste caso especifico, tenho tendência a concordar com o Pedro. Esta maga promoção só está a ser mais comentada por ser inesperada e por ter ocorrido no dia 1 de Maio.
Ou seja, a Jeronimo Martins fez uma gigantesca campanha publicitária/marketing que tem levado a que todos os noticiários continuem a abrir com esse assunto (pelo menos até hoje de manhã), levou esse assunto a ser discutido na Assembleia (onde não deve haver nada mais interessante para se discutir) e colocou todas as pessoas a falar do assunto.
Pagar €30.000 de multa por essa campanha e considerar os eventuais prejuizos ficará seguramente abaixo do custo de pagar uma campanha publicitária com tantos minutos.
Para além disso, já imaginaram os descontos de pronto pagamento que a JM pode exigir aos seus fornecedores? (afinal e contas, a liquidez do Grupo deve ter crescido exponencialmente)

A campanha não me chocou e nem me parece que haja motivos suficientes para promover uma investigação da Autoridade da Concorrência. No exterior já se fazem estas campanhas e ninguém parece incomodar-se com isso.

Quanto à data escolhida, foi a ideal:
1- calou os criticos da alteração da sede para a Holanda
2- apanhou a ASAE a gozar o feriado
3- os consumidores estavam livres a gozar o feriado e não tiveram de faltar ao emprego

Cenas dos próximos capitulos: a montanha vai parir um rato na investigação da ASAE ou da Autoridade da Concorrência e o processo será arquivado ou será paga uma pequena e insignificante multa.

Recordem-se que aquando da campanha publicitária em que o Pingo Doce passava uma música que ficou no ouvido durante largos minutos, também houve muita critica, alguns processos mas acima de tudo, muita dor de cotovelo!

Resumindo: Grande Campanha publicitária! Grande equipa de Marketing!

Paulo Santos Monteiro disse...

Confesso que não conheço bem a legislação. Mas pensava que nada impedia os descontos ocasionais... porquê tanta polémica?

Nuno Vaz da Silva disse...

Onde escrevi maga promoção, queria dizer mega promoção.
Paulo, a polémica ocorre por 2 motivos:
1- simbologia do 1º de Maio
2- lobby da aparente pratica anti-concorrencial

Quanto ao primeiro,temos uma franja da população (predominantemente de ideologia de esquerda) que considera que não se deve trabalhar nesse dia do trabalhador (o que sempre me fez confusão mas respeito). Os sindicatos também têm um papel muito activo nesta posição.
Quanto ao segundo, temos a pressão da comunicação social, das forças politicas de esquerda e da concorrência.

Portanto, há uma clara guerra ideológica sobre a abertura de superfícies comerciais em dias "festivos" e a pressão politica e dos media que me parece demagogica pois ainda não vi argumentos sólidos contra a promoção da Jeronimo martins. João, desculpa que discorde da tua posição que respeito e que muito aprecio por ser critica mas muito sustentada. Neste caso, apenas considero que os argumentos que utilizaste não são suficientes para contrariar uma politica comercial e que não pode ser censurada à luz das leis da concorrência!

Jose Lapalice disse...

Este é o melhor e simultaneamente o pior exemplo do resultado da guerra entre Pingo Doce e Continente. http://economico.sapo.pt/noticias/asae-apreende-leite-no-pingo-doce-e-no-continente_135832.html . Importar leite do estrangeiro e vendê-lo em Portugal abaixo do custo. Conseguem vender leite no supermercado abaixo do preço a que os produtores portugueses conseguem vender a eles. Destruindo assim a produção nacional de leite. Mas pronto, o que interessa é o consumidor estar a beneficiar temporariamente de uma guerra de preços. Tudo o resto que vá às malvas.....

Pedro Antunes disse...

Lapalice, aceito a correcção (penso que os 4/5% tinham a ver com o valor da empresa mas não vi o detalhe dos estudos). Independentemente da diferença de valores o ponto mantém-se.

Nuno, esses descontos eles já pedem sem ter de pagar a pronto! LOL

Paulo, os descontos pontuais podem ser feitos. É uma questão depois de preço médio. Até fiquei admirado com a conclusão da ASAE hoje publicada. Nota que o desconto foi no talão, pelo que a imputação interna do desconto só o PD sabe… A polémica é bem explicada pelo Nuno Silva no comentário logo seguido ao teu pelo que não vou repetir! :)

Pedro Antunes disse...

Lapalice, mas estás a sugerir que o consumidor subsidie a ineficiência dos produtores nacionais?

Jose Lapalice disse...

Vou tentar explicar devagarinho, para ver se me faço entender.
1º: Pingo Doce e Continente querem ganhar quota de mercado
2º: Um bom produto para fazer guerra de preços é algo como o leite
3º: Vai-se buscar leite onde seja mais barato (ou Espanha ou Polónia ou outro, se bem que na Espanha o preço pago ao produtor até parece ser o mesmo do português)
4º: A marca branca de leite do Pingo Doce e Continente ganha quota de mercado à custa de vender abaixo do preço de custo durante algum tempo
5º: Passado o tempo de resistência dos produtores e da Lactogal, a produção nacional de leite vai para o brejo. acaba
6º: após isso, então vai-se importar quase a totalidade do leite que se consome em Portugal, os preços voltam a subir ao valor que estavam em 2009 (ou mais), os consumidores já não ganham mais nada, e uma indústria agrícola foi com os porcos.

Ps: Há uns meses aconteceu isto: http://www.ionline.pt/mundo/falta-manteiga-afecta-noruega. E porque razão os preços disparam em flecha? Porque a Noruega protege os seus agricultores. E protege não somente por nadar em dinheiro, mas sim porque sabe da importância de valorizar o que é nacional. O português médio, se encontrar uma laranja espanhola à venda 5 cêntimos mais barata que a portuguesa vai preferi-la à nacional. Ele poupa. Mas o país perde. O individualismo português no seu pior :(

Jose Lapalice disse...

http://www.milkprices.nl/reviews/eng201203.pdf

Unknown disse...

Boa tarde a todos,

Os 4-5% referiam-se aos activos do grupo, segundo li numa notícia (em segunda mão, portanto). Não me fez muito sentido mas poderá ser explicado pelas amortizações acumuladas em Portugal face a uma operação mais recente como a polaca.

Quanto à questão, não ponho em causa a eficácia da promoção, do ponto de vista do accionista da JM ou da sua gestão.

O que está em causa é (i) se queremos esta "eficiência" de curto prazo, (ii) se queremos uma empresa a fazer política (sou só eu que estranho o presidente do CA afirmar desconhecer esta acção?), (iii) se queremos uma sociedade em que a lógica da concorrência se sobrepõe à lógica da convivência ou (iv) como é que queremos repartir o poder negocial entre produtores,trabalhadores, consumidores e distribuidores.

São questões do foro político. Do que queremos para a nossa sociedade. Se queremos um grupo económico a entrar desta forma nessa discussão - ou, invocando Rousseau (pedindo desculpa ao Pedro), se queremos a JM a quebrar o contrato social duma forma tão grosseira.

A todos um abraço e parabéns pelo tema.

Pedro Antunes disse...

Lapalice (por ponto para facilitar):

1. Não é esse, a dado momento, o objectivo de toda a empresa? Não é correcto esse ímpeto para ganhar quota (que significa que estão a dar reconhecido valor aos consumidores? Mesmo que ganhem uma posição dominante no mercado, não está o consumidor livre de passar a comprar num concorrente? Existe algum custo de mudança para o consumidor?

2. Guerra de preços faz-se com cabazes e não com produtos únicos. Os consumidores não são estúpidos e até sabem fazer comparações. O arroz também é óptimo para isso. O azeite. O sal. O açúcar. São os chamados produtos âncora, normalmente com margens reduzidíssimas. Também se vê um conceito semelhante com as marcas âncora. Nenhum distribuidor se pode ver sem Coca-Cola ou Nutella. Aí as margens são mantidas.

3. Também se podia ir buscar a Portugal se os produtores fossem mais eficientes. Tu culpabilizas o distribuidor e não o produtor nacional que nem consegue competir com países que para além do custo normal de produzir o leite ainda têm de o transportar centenas ou milhares de quilómetros… A pergunta não devia ser "Porque é que o leite Português é tão caro?"

4. Para essa afirmação tens de dar provas disso.

5. Se não temos uma vantagem competitiva num produto (e não sei se o leite é um caso desses) devemos importá-lo e focar os nosso recursos em produzir aquilo em que temos essa vantagem competitiva.

6. Ver ponto 3 e 5!

João:
À Biedronka ainda se adiciona a JV com a Unilever, entre outros negócios, mas isto até era um detalhe na discussão. Não concordo contigo que o que está em causa sejam esses 4 pontos e a minha razão é simples: isto foi uma acção de Marketing… pura e dura! Se foi episódica ou fruto de uma nova política de posicionamento como hard discounter (o PD já era discounter) veremos. E o PD tem o direito de fazer uma ou outra coisa…

O único histerismo que me preocupa é o dos comentários à volta deste assunto!!

Primeiro: Não teve nada a ver com política. O AS não ganhava nada em fazer disto um statement político, alias como se vê! Qualquer pessoa com dois dedos de testa sabia as consequências e reacções a esta acção, que em nada são ideais para uma posição política.

Segundo: Não teve nada a ver com leis laborais ou ideologia - a esquerda não é dona do 1º de Maio, nunca foi. Os empregados mantiveram o feriado (folgam outro dia), receberam mais do que num dia normal e ainda vão gozar do desconto de 50% durante uma semana! Os empregados tiveram de fazer os seus turnos normais, como em qualquer feriado em que o PD está aberto.

Terceiro: O poder negocial destas entidades tem uma forma de se auto-regular (algo informal e há quem diga até algo irregular). Há até produtores que têm uma força negocial interessante mesmo contra o líder de mercado (SONAE). De vez em quando entram em conflito, mas acaba-se sempre por resolver (notem os períodos longos em que produtos de uma empresa grande desaparecem de uma insígnia, substituídos em massa no linear por marca própria ou da marca concorrente mais directa para depois voltarem a aparece 2/3 meses mais tarde sem grande alarido).

A JM não tem nenhum contrato social para além de ser uma empresa que cria emprego, paga os seus impostos e cumpre a lei laboral.

Jose Lapalice disse...

De novo por pontos:

1- Se cumprirem a lei, sim é válido
2- Como é referido e bem, há produtos âncora. E o leite é um deles. E se dou o exemplo do leite é porque é aquele em que existe mais informação pública disponível
3- Eu não sou nenhum perito em leite. No entanto, a ser verdade esta notícia: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/opiniao/agricultura-falida, pelo menos para alguns produtores em Portugal o leite é pago a 30 cêntimos. Neste site: http://www.milkprices.nl/reviews/eng201203.pdf também vejo que a média do preço pago ao produtor em 17 indústrias de 8 países europeus foi de 33,7 cêntimos. Tu é que tens de provar em que te baseias para dizer que o leite português é tão caro.
4- Qualquer pessoa dotada do dom de saber matemática básica consegue perceber isso.
5- Esse argumento foi tirado de algum discurso de políticos portugueses dos anos 90 para sustentar a destruição da agricultura portuguesa? Não é muito original devo dizer. Além de que como refiro no ponto 3, não sei se Portugal é assim tão mau a produzir leite
6- Ver o 3º parágrafo do comentário do João Neves.

Pedro Antunes disse...

Lapalice, estás a ser incoerente.

Primeiro afirmas: "3º: Vai-se buscar leite onde seja mais barato (ou Espanha ou Polónia ou outro, se bem que na Espanha o preço pago ao produtor até parece ser o mesmo do português)." Agora dizes que é mais barato? Para mim ser o leite ou outro produto qualquer é-me igual. O meu ponto é que o PD, como qq outra insígnia, vai buscar produto onde consegue tirar mais lucro. E convém não esquecer que isso não significa só melhor preço no produtor. É preciso ter em conta as ineficiências, serviço, resposta do consumidor.
Como tal o meu ponto mantém-se: o PD vai buscar produto onde for mais eficiente, para os seus lucros.

Em relação ao teu quarto ponto: As insígnias mantém o preço da marca própria mais ou menos constante o ano todo (no continente há algumas promoções). É um preço mais baixo do que dos produtos "de marca". Em nada aqui tens provas de que essa venda é feita a baixo do custo do produtor.
O documento que partilhas até pode ser credível… curiosamente nada diz acerca de Portugal. A notícia com a qual o comparas não é. É um artigo de opinião de Isménio Oliveira, Coordenador da Associação Distrital dos Agricultores de Coimbra, e parte mais do que interessada em dizer este tipo de coisas. Nota que a única coisa que ele consegue fazer é assumir a incompetência dos produtores de leite da beira litoral em conseguir preços competitivos com os importados.
A matemática é básica, mas ter números credíveis não o é.

Quinto ponto: Não pretendo originalidade. Pretendo eficiência. E o facto de nos anos 90 o discurso ter sido no mesmo sentido não significa que as medidas tenham sido as correctas. Não estou certo que Portugal não tenha vantagens comparativas na produção de leite, não sei o suficiente acerca do assunto, mas sei que temos algumas vantagens na produção hortícola e as políticas dos anos 90 não as potenciaram… o que me leva a dizer que foi mais conversa do que acção.

Pedro Antunes disse...

Lapalice, estás a ser incoerente.

Primeiro afirmas: "3º: Vai-se buscar leite onde seja mais barato (ou Espanha ou Polónia ou outro, se bem que na Espanha o preço pago ao produtor até parece ser o mesmo do português)." Agora dizes que é mais barato? Para mim ser o leite ou outro produto qualquer é-me igual. O meu ponto é que o PD, como qq outra insígnia, vai buscar produto onde consegue tirar mais lucro. E convém não esquecer que isso não significa só melhor preço no produtor. É preciso ter em conta as ineficiências, serviço, resposta do consumidor.
Como tal o meu ponto mantém-se: o PD vai buscar produto onde for mais eficiente, para os seus lucros.

Em relação ao teu quarto ponto: As insígnias mantém o preço da marca própria mais ou menos constante o ano todo (no continente há algumas promoções). É um preço mais baixo do que dos produtos "de marca". Em nada aqui tens provas de que essa venda é feita a baixo do custo do produtor.
O documento que partilhas até pode ser credível… curiosamente nada diz acerca de Portugal. A notícia com a qual o comparas não é. É um artigo de opinião de Isménio Oliveira, Coordenador da Associação Distrital dos Agricultores de Coimbra, e parte mais do que interessada em dizer este tipo de coisas. Nota que a única coisa que ele consegue fazer é assumir a incompetência dos produtores de leite da beira litoral em conseguir preços competitivos com os importados.
A matemática é básica, mas ter números credíveis não o é.

Quinto ponto: Não pretendo originalidade. Pretendo eficiência. E o facto de nos anos 90 o discurso ter sido no mesmo sentido não significa que as medidas tenham sido as correctas. Não estou certo que Portugal não tenha vantagens comparativas na produção de leite, não sei o suficiente acerca do assunto, mas sei que temos algumas vantagens na produção hortícola e as políticas dos anos 90 não as potenciaram… o que me leva a dizer que foi mais conversa do que acção.

Jose Lapalice disse...

O PD e o Continente ao venderem leite a 20 cêntimos o litro, estão a vender com prejuízo. Nem na Polónia, que é um grande produtor de leite e com custos mais baixos, se conseguem preços tão baixos (http://www.clal.it/en/index.php?section=confronto_est). O que eles estão a fazer é vender um produto-âncora com prejuízo, abaixo de preço de custo, a fazer concorrência desleal face aos produtores de leite portugueses com vista a: a) atrair pessoas para as suas lojas e b) forçar a saída dos produtores de leite portugueses . Tu podes acreditar ou tentar fazer acreditar outros de que eles estão a ter lucro na venda do leite a 20 cêntimos. Talvez na China se consiga ir buscar leite a esses preços e ter lucro. Na Europa, se calhar nem na Moldávia. Já vi que deves ter preconceito em relação a agricultores, pelo que encontrei agora dados da Direcção Geral de Agricultura da Comissão Europeia. http://www.dairyco.org.uk/datum/milk-prices-and-contracts/farmgate-prices/eu-farmgate-milk-prices.aspx . Os números falam por si. Aguardo pela tua partilha de alguma informação de alguns números contraditórios.

Se o critério é a eficiência, então que não se produza nada de hortícolas em Portugal e se importe tudo de Marrocos. Está suficientemente perto de Portugal para os custos e tempos de transporte não serem exagerados, tem salários mais baixos, portanto, só vantagens para serem mais eficientes que os portugueses.

Pedro Antunes disse...

Preços leite (por litro):
Continente:
- UHT Meio Gordo - É = 0,49€
- UHT Magro - Continente Equilíbrio = 0,49€
Jumbo:
- UHT M/gordo - Polegar = 0,48€
- UHT Magro - Polegar = 0,49€
Pingo Doce:
Não consegui aceder.
São os mais baratos que encontras e longe dos 20 cêntimos. E até podíamos entrar aqui no detalhe da unidade "standard milk" em litros face ao leite que se vende nas lojas. (uma unidade de "standard milk" dá diferentes unidades de leite consoante for magro, meio gordo, gordo, com aditivos, do dia, em pó…).

Do site da DGACE:
Preço por litro em Portugal: 0,2747€
Logo: margem bruta face ao mais barato na lista a cima: 74,7%
E ainda: margem bruta durante o dia da promoção PD (assumindo preços por litro iguais aos do Jumbo M/gordo): −12,6%

Podes fazer estes cálculos para todos os produtos que a ASAE identificou se quiseres que cairás sempre no seguinte (foram 3, certo?): Vender com prejuízo não é ilegal e nada tem a ver com dumping desde que não seja de forma sustentada. Uma promoção, um dia, não é isso. Aliás, já vários produtores vieram aos media dizer que as relações com a distribuição são normais. Cairás também na alocação do desconto dos 50%. O PD pode sempre alegar que o Whiskey não teve desconto e que nos outros produtos se compensou com descontos maiores. Só têm de mostrar essa alocação interna.
Mas já agora noto, no site da DGACE, que a produção nacional aumentou 8,2%… não me parece ser um sinal de uma indústria com o tipo de problemas de que Isménio Oliveira se queixa.

Não só não tenho preconceitos quanto aos agricultores como tenho produção agrícola, sem apoios estatais, e faço dinheiro com isso.

A competitividade e eficiência não se reduz a custo salarial. Para produzires produtos hortícolas tens de ter terreno e clima para isso. Esse é o principal factor de competitividade, como aliás é fácil de perceber. Em cima disso ainda podes colocar infra-estrutura de transportes (superior em Portugal) e de cultivo (também superior em Portugal, se bem que com imensas ineficiências).

Jose Lapalice disse...

Decreto-lei nº370/93, artigo 3º - Venda com prejuízo. http://dre.pt/pdf1sdip/1993/10/254A00/60956096.pdf

E sim, também li o texto onde explica que a escapatória é lei das promoções: http://www.netconsumo.com/2012/05/o-que-sao-vendas-com-prejuizo.html

Jose Lapalice disse...

http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=517886&tm=6&layout=122&visual=61 . Já agora, ainda não se sabe nada das consequências desta apreensão. É a lei e a regulação portuguesa no seu ritmo normal.

Pedro Antunes disse...

Lapalice, por acaso houver alterações a esse DL em 1998. Não fosse isso irrelevante para o caso até era interessante colocar isso aqui.

No caso particular do leite, e descobri isso ontem, ainda temos as seguintes questões:

1. A Lactogal tem 90% do mercado português. É o maior operador da peninsula ibérica (apesar de não chegar aos 20% de quota de mercado). Com 90% de quota em Portugal é um operador mais relevante no esmagamento dos produtores do que a distribuição.
2. A produção espanhola de leite é excedentária. Como tal, a partir de uma certa quantidade o leite é vendido a qualquer preço, desde que cubra os custos variáveis.

Tento em conta isto:
A - Os produtores deviam dirigir as suas criticas (i) à Lactogal por uso de posição dominante; (ii) à CE pelas práticas dos espanhóis; (iii) aos consumidores nacionais que compram puramente por preço; (iv) ao Estado por não criar as devidas condições para haver excesso de produção em Portugal e passarem a fazer o mesmo que os espanhóis.
B - Vai ser fácil ao PD demonstrar não terem feito dumping, nem que seja com base no artigo 3º, ponto 4C do DL 370/93

Jose Lapalice disse...

Mas tem 90% do quê? Do total das vendas de leite de pacote? Da recolha de leite? Do quê exactamente?

" Fernando Cardoso, secretário-geral da Fenalac, Federação Nacional das Cooperativas de Leite e Lacticínios, garante que este não é um mercado concentrado. Os três accionistas da Lactogal recolhem 820 milhões de litros de leite em Portugal, "o que equivale a 46% do total nacional", e 66% da recolha de leite feita no continente. No mercado lácteo (inclui os produtos derivados do leite), a Lactogal tem um peso nas vendas de 31%, seguida da Danone, que vale 15%."" http://www.asor.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=825:vivemos-rodeados-de-empresas-dominantes-no-mercado-desde-a-saude-aos-combustiveis&catid=31:sindicato-noticias-anteriores&Itemid=98

O que tu referes sobre o que os espanhois fazem é a própria definição de dumping. Cobrir os custos variáveis não significa que cubra todos os custos.
E o que referi que julgo que vá ser o caminho legal vai ser o da venda com prejuízo, não o de dumping.

Pedro Antunes disse...

Quanto aos 90%, I stand corrected, mas 66% não deixa de ser uma posição muito dominante (os 90% foi um erro de cálculo meu, revi e de facto confirmo os teus 60s - recolha).

Lapalice, vender uma unidade ao preço de custo marginal não é vender abaixo de custo. Aliás, qualquer gestor médio sabe que se tiver comprador para um preço acima do custo variável deve vender, o volume trata de cobrir os custos fixos.

Diz-me onde é que na legislação portuguesa tens o conceito de dumping.

Jose Lapalice disse...

Sobre dumping, não sei de legislação. Como referi, julgo que o caminho a seguir será o de venda com prejuízo. Não sou perito na legislação deste sector e já está mais do que visto que estes assuntos vão só dar despesa a investigar e resultados concretos nicles.

Em todo o caso, quero acreditar que se a ASAE faz apreensões e diz que há infracções, é porque algo no mínimo suscita dúvidas sobre legalidade.

E é pena é que o Pingo Doce não faça em Portugal o que a Jerónimo Martins faz na Polónia: focar a sua publicidade na produção agrícola nacional. " Over 900 products are available in stores, out of which almost 95% derive from Polish production." . http://www.biedronka.pl/about_us/biedronka/who_we_are/ .
Mas também, se a JM não faz tanto isso em Portugal é porque sabe que não há problema em importar. O português só quer saber do preço.

Pedro Antunes disse...

Lapalice, dumping e venda a prejuízo são a mesma coisa.

Claro que a ASAE faz apreensões quando tem indícios… mas indícios e prova são coisas diferentes. Eu prefiro assumir como inocente qualquer entidade até à decisão final… Chama-me esquisito.

Se o PD (ou qq outra insignia) não o faz em Portugal é porque o consumidor não parece responder a isso. Talvez com esta crise os portugueses voltem a valorizar o que é nacional. Vejam este episódio do NO RESERVATIONS (http://www.youtube.com/watch?v=sC73r8vcnIM)

Jose Lapalice disse...

http://www.youtube.com/watch?v=64HMX81qs2s . Isto é que é cozinha portuguesa autêntica e apresentada por um autêntico português, com farta bigodaça. Não comida portuguesa feita (bem feita, ao que parece) por um bósnio em quantidades minúsculas :p :p

Ps: No episódio de Lisboa o Lobo Antunes diz que às vezes pensa que Portugal é aquilo que o oceano não quer. Não valorizou propriamente Portugal :(

Pedro Antunes disse...

Lapalice, cada um vê o que quer, mas para mim ver um cozinheiro estrangeiro a repensar a nossa comida é um sinal de sucesso… só tenho pena que seja um estrangeiro em Portugal e não um estrangeiro em NY.

Lobo Antunes é um desiludido deprimido e deprimente, para mim. Penso que tem as suas razões para o ser, da experiência que tem. É uma pessoa que merece o meu respeito, mas em nada define o meu país.