Desde 2011 que os portugueses têm sofrido as consequências das medidas de austeridade que foram tomadas na sequência do acordo com a Troika. Em época de contenção orçamental é habitual criticar as politicas impostas e os efeitos das mesmas para os contribuintes. Sabemos perfeitamente o que perdemos com a entrada da Troika no nosso país! Mas saberão os portugueses o que ganharam com a troika?
O recurso à Troika, constituída pelo Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu, foi uma solução de fim de linha. Só pede ajuda externa (e aceita a imposição de condições do exterior) quem já não tem hipóteses para resolver sozinho os seus problemas. Portugal pediu ajuda porque precisava de dinheiro com urgência. Esse dinheiro tinha como objectivo pagar salários, pensões, subsídios e ainda liquidar dividas aos credores, que anteriormente já nos tinham emprestado verbas para gastos e/ou investimentos. Sem a Troika, os portugueses teriam ficado sem receber estes rendimentos e os nossos credores ficariam impossibilitados de recuperar o capital financiado, o que geraria uma enorme crise de expectativas e o inevitável fim do crédito externo.
Com a ajuda internacional, pudemos continuar a receber salários, pensões e subsídios e continuámos a ser um país que respeita os compromissos assumidos ao liquidar as dívidas perante os investidores. Mas, além destas vantagens de índole financeira, Portugal ganhou também uma maior eficiência na gestão das contas públicas, sem contemplações para interesses partidários e/ou de grupos de interesse. O apoio da Troika tornou possível a identificação de lacunas e erros na organização do Estado, na gestão de entidades e empresas públicas, autarquias e regiões autónomas, evitando (pelo menos para o futuro) gastos que seriam ainda mais gravosos se continuassem a ser feitos.
É verdade que as medidas impostas pela Troika são bastante difíceis para todos e podemos até discutir se, em função das especificidades do nosso país, são ou não as mais adequadas. Mas quando falamos dos prejuízos que a Troika nos trouxe, não podemos deixar de imaginar como seria viver num país em bancarrota (ou seja, sem pagar salários, pensões ou subsídios e que não teria mais dinheiro do exterior por não cumprir as responsabilidades assumidas com os credores). Se nenhuma medida de ajustamento tivesse sido tomada, continuaríamos a ser um país com problemas de gestão pública, despesismo não contabilizado e com muitas outras ineficiências por resolver.
Não se trata de apoiar as medidas de um ou outro partido. Aliás, as três principais forças politicas concordam com o plano de ajustamento que está em curso! Trata-se de optar pela solvabilidade sob condições ou pela bancarrota sem misericórdia! E ninguém se iluda porque só seria possível renegociar dividas se ambas as partes (devedor e credores) estivessem de acordo com as condições da renegociação. Mesmo os que defendem o crescimento a qualquer custo, não se devem esquecer que o crescimento sem rigor, é insustentável e perverso no médio prazo!
É relativamente simples e populista afirmar que o plano de ajustamento é mau, que podíamos ter optado por outro caminho ou que as condições impostas são demasiado rígidas. Mas ao fazer isso, devemos indicar qual seria esse caminho e de que forma poderíamos ter uma melhor solução para os problemas do país.
Aos políticos exige-se que apresentem argumentos verdadeiros e que não tentem angariar votos pela demagogia simplista de identificar apenas os prós ou os contras de uma política! Da comunicação social espera-se isenção perante as soluções dos problemas e a explicação dos pontos positivos e negativos das decisões tomadas pelos políticos! Só assim poderemos ser uma sociedade mais evoluída e melhor esclarecida!
Nuno Vaz da Silva
Economista
Artigo publicado na edição de 30/05/2012 do Jornal Alto Alentejo e também publicado no blog Deseconomias
4 comentários:
Nuno,
Concordo bastante com este teu artigo. Acrescentaria que é importante que os principais partidos do governo e da oposição adoptem uma política construtiva em relação à troika, procurando trabalhar em conjunto com esta para tentar realizar as reformas políticas e económicas mais adequadas para o futuro do país. De certeza que as opiniões divergem, mas trabalhando em conjunto será possível encontrar as melhores soluções para o país.
Eu ainda estou para perceber que eficiências nos gastos do Estado é que conseguimos. Eficiência para mim é aplicar a lei do menor esforço que é uma lei básica da Economia. Cortar em todo o lado, indiscriminadamente, que é o que, salvo melhor opinião, se está a fazer agora não vai resolver coisa nenhuma. O essencial era cortar onde é preciso, onde há gastos supérfluos, onde há redundâncias, onde o Estado é despesista e gastar mais, e gastar o que for preciso, sempre e quando esse investimento seja necessário e mais ainda onde traga retorno. Não é nada disso que se vê. O que se vê é cortar, cortar, cortar e cortar. Em todo o lado e com palas à frente dos olhos. Naturalmente que esta política, a longo prazo, não vai resolver coisíssima nenhuma. Sobretudo se, conforme anunciado, o Estado acabar com os cortes que impôs à função pública. Claro que na minha modesta opinião, o governo que vier a seguir não vai ter condições de repor esses subsídios....
Se o recurso a’ Troika foi a solução encontrada face a uma situação de possível bancarrota em Portugal, as “vantagens” financeiras que a Troika trouxe com ela (pagamento de salários, pensões, etc) parecem-me mais uma resposta e cumprimento de obrigações do Estado para com os seus funcionarios do que propriamente “vantagens”! Não me parece uma vantagem receber o meu salário! Mas parece-me uma desvantagem não o receber. Vantagem sobre o que? O apoio seria sempre nesse sentido.
Contudo, o que me soa mais controverso neste artigo, ‘e de facto a situação idealista que descreves, que não me parece de todo corresponder a’ realidade, nomeadamente a actual “eficiência na gestão das contas publicas”, a não contemplação de interesses partidários e grupos de interesse, a identificação de lacunas na organização do estado, etc, etc, etc… soa tudo muito perfeito!
Pagamentos de salários e afins, ‘e verdade que tem sido possível devido ao apoio da Troika, mas o seu valor ‘e única e exclusivamente de curto prazo, pois medidas de crescimento económico a longo prazo que permitam, por exemplo, continuar a pagar esses mesmos salários e afins no futuro, nada. Remendos!
O que ganhou Portugal com o apoio da Troika? Isso ‘e o que ainda estamos para ver… Pagamento de dividas comprometem os orçamentos em muitas áreas, nomeadamente sociais. E isso, terá indiscutivelmente, repercussões no futuro.
Obrigado pelos vossos comentários!
Eu imaginei que o meu artigo despertasse alguma polémica.
Miguel, uma expressão popular que conheço há muitos anos diz que " se não há dinheiro, não há vicios!"
Este é um ensinamento popular para aquilo que está a acontecer no país. Do ponto de vista económico faria sentido que em épocas de crescimento, o Estado fizesse uma politica contraciclica de contenção orçamental com o objectivo de amealhar verbas para sustentar futuros choques economicos e eventuais recessões. Em Portugal não só não fizemos isso como gastámos de mais durante os periodos de crescimento. Assim, logo que houve um choque, a sustentabilidade da nossa divida foi ameaçada....fomos um alvo deamsiado fácil por culpa nossa!
Concordo que os cortes não deviam ser cegos mas a verdade é que não há dinheiro.
Marta, a vantagem que indico foi entre ter dinheiro com condições ou pura e simplesmente não o ter. Por muito que nos custem as medidas, temos de reconhecer que a maioria dos pontos mencionados no MoU estavam há muito referenciados por vários especialistas. Será que teriamos "descoberto" a divida da Madeira? O que aconteceria se o projecto do TGV não tivesse sido cancelado? Qual o Governo que teria coragem de limitar os cargos dirigentes das autarquias? Quem arriscaria colocar o dedo na ferida das PPPs? ...são apenas alguns exemplos
Concordo que precisamos de medidas de longo prazo mas essa é uma responsabilidade do Governo e não da Troika. Fazendo uma analogia, quando alguém está doente e tem de faltar ao emprego para se tratar, não podemos exigir que seja o médico a resolver o problema profissional do paciente. No nosso caso o paciente é o Estado representado pelo Governo e o médico é a Troika! :)
Paulo concordo contigo mas isso será dificil de acontecer. Os erros da gestão pública europeia dos últimos anos têm potenciado os efeitos dos ciclos económicos. Após esta fase de grande contracção, teremos uma inevitável viragem à esquerda com mais despesismo de forma a minorar os impactos sociais das medidas restritivas. Dessa forma, os partidos da oposição em Portugal estarão mais preocupados em alcançar o poder do que em garantir a estabilidade do Estado.
Uma última nota para não nos esquecermos que a divida pública portuguesa é muito elevada e tem provocado todos estes problemas orçamentais. Mas a divida das empresas é proporcionalmente maior do que a pública.
Ou seja, temos um problema cultural que nos motiva a gastar e a viver acima das possibilidades e num modelo económico simples, com inflação controlada, isso é insustentável!
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