quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Algo fora de tópico...


Em alegre debate com um grupo de amigos sobre “atos eleitorais” surgiu-me uma dúvida: Porque é que as eleições têm de ser feitas em apenas um dia?

Hoje em dia muitas pessoas queixam-se, logo no dia a seguir às eleições, das mesmas não serem representativas da população por causa da abstenção. Outras queixam-se que foram feitas num domingo, ou num momento de férias... tudo serve, aos "perdedores" crónicos, para subverter ou descredibilizar o ato.

Uma das questões que nos pareceu interessante perceber era qual seria o impacto das eleições não serem feitas em apenas um dia, mas durante um período mais alargado de tempo, preferencialmente por via electrónica para conter custos.

Vamos imaginar que um ato eleitoral acontecia durante X dias. Por exemplo começava numa Segunda-feira e terminada na Sexta-feira seguinte. Ao fim de cada dia seriam publicados os resultados (especialmente se votação electrónica). O eleitor que ainda não tivesse votado analisaria o estado da eleição e decidiria se valia a pena ir votar ou não, independentemente da razão invocada! Uma verdadeira análise custo-benefício.

No decorrer do alegre debate, mesmo quem não concordava com este modelo, não conseguimos construir um argumentário contra este modelo. A grande vantagem seria um voto mais informado das suas consequências.

Porque não?

42 comentários:

José Lapalice disse...

Algures na constituição virá que o voto é secreto.
Publicar resultados enquanto uma eleição decorre, para mim, é uma maneira de votar condicionadamente.

Pedro Antunes disse...

Não percebo o que é que a solução implica acerca do secretismo do voto, especialmente se este for electrónico.

E qual é a problema de votar condicionado (e não condicionalmente) pela sua própria análise de custo-benefício?

Nuno Vaz da Silva disse...

Desconfio que, se a eleição fosse repartida por mais dias, teríamos uma ainda maior taxa de abstenção. Mas deveríamos poder votar em qualquer mesa de voto ou através da internet para o caso de no dia de eleições estarmos num outro qualquer lugar que não na localidade onde votamos

Nuno Vaz da Silva disse...

Desconfio que, se a eleição fosse repartida por mais dias, teríamos uma ainda maior taxa de abstenção. Mas deveríamos poder votar em qualquer mesa de voto ou através da internet para o caso de no dia de eleições estarmos num outro qualquer lugar que não na localidade onde votamos

Pedro Antunes disse...

Nuno,

Completamente de acordo... até por uma aplicação móvel o podíamos fazer. O formato em si seria o que fosse fiável.

Os vários dias seria para se o PS estivesse a ganhar e a população o quisesse penalizar, um abstencionista típico poderia ver-se mais motivado a ir votar e assim ter um resultado mais próximo do que a população queria.

Nuno Vaz da Silva disse...

Pedro, nesse caso teríamos o problema dos incentivos a funcionar e que teria como resultado que a grande maioria, à boa maneira portuguesa, votasse apenas no último dia ou já nem votasse caso a diferença entre candidatos fosse muito grande!
Votação em vários dias poderia ter algum interesse mas seria muito caro e nunca poderia levar a sucessivas divulgações de contagens e anúncios faseados dos votos.

José Lapalice disse...

Para mim voto secreto significa não saber em quem votaram aos outras pessoas, ou as outras pessoas não saberem em quem votei.
Se eu antes de votar, já souber em quem votaram alguns cidadãos, é porque o voto não é secreto.

votar condicionado subverte a igualdade do voto. existiriam assimetrias de informação por causa disso, o que enviesaria o processo.

José Lapalice disse...

Sobre internet ou aplicações móveis para votar, de que forma seria validada a identidade do eleitor?

Pedro Antunes disse...

Nuno,

Os custos só existiriam se o formato não fosse electrónico.

Quanto aos incentivos não me parece que funcionassem assim. Se eu visse um resultado contrário à minha vontade a minha análise custo-benefício teria como resultado um maior benefício em ir votar para contrariar a tendência.

Também não gosto muito dos raciocínios do "à portuguesa". Não somos um povo monolítico nem deixamos tudo para a última da hora.
A ideia de anunciar os resultados parciais parece-me interessante. Porque não?

Lapalice,

O que escreveste não faz sentido por várias razões:

1. Hoje os resultados já são anunciados e não é por isso que se sabe quem voto em quem. O anonimato do voto é mantido se o anúncio for feito nos mesmos moldes que o resultado final é hoje feito. Nunca alguém sabe por quem eu votei... nem mesmo se eu o disser.

2. Hoje já se anuncia parciais. Durante a contagem vai-se apurando os resultados por circulo eleitoral e não é por isso que o voto é menos secreto.

3. Todos os votos são condicionados. Pela educação, informação que te dás ao trabalho de ler (assimétrica), sondagens...

Pedro Antunes disse...

Sobre o formato (apps, internet e afins) há imensas soluções... não é esse o problema!

José Lapalice disse...

1- os resultados são anunciados depois de terminar o processo de voto.

2- tenho 32 anos e desde que voto nunca tive acesso a resultados parciais, nem a saber o apuramento de resultados pelo meu círculo antes de votar.

3- sem comentários.

4- há imensas soluções que permitem saber com 100% de certeza que a pessoa que está a usar o telemóvel ou o pc é mesmo o eleitor? não digo que não haja, mas imensas? E os custos disso? é algo viavél em 2013, quando ainda nem sequer temos voto electrónico nas mesas de voto?

Pedro Antunes disse...

Lapalice,

1. Sim.

2. Tens de ver mais vezes as "noites de eleições" dos variados canais televisivos. Não me referi a antes do processo de voto terminar.

3. Pq? As sondagens até são bastante boas a prever resultados.

4. O conceito "imensas" é subjectivo, tens razão. Há urnas electrónicas, também há soluções em PC e telemóvel. O voto presencial também não garante 100% que a pessoa que vota é mesmo o eleitor.
Em 2013 não estão previstas eleições pelo que esse ponto é irrelevante.

Pedro Antunes disse...

4. E de qualquer forma só precisarias de uma! :)

José Lapalice disse...

2- mas a proposta não era voto durante uma semana, p.ex., com divulgação de votos no final de cada dia, para que o eleitor pudesse fazer uma análise custo-benefício para saber se valeria ou não a pena ir votar?

4- Primeiro tens de acompanhar melhor o calendário eleitoral: Autárquicas 2013.
Segundo, ter a própria pessoa, que se desloca a determinada mesa de voto, onde tem de entregar a sua identificação pessoal para confirmação, não garante a 100%. mas anda lá muito mais perto do que as soluções electrónicas ou informáticas de acesso geral.

Pedro Antunes disse...

2. A proposta era uma eleição por mais de um dia com anúncios intercalares. Os 5 dias foi para facilitar a explicação. A questão dos parciais é que não afectam de forma alguma o segredo de voto. Podem afectar o sentido de voto, mas não é claro para mim que isso seja mau.

4. Tens razão, confundi com as Europeias! :)
Tens soluções de voto electrónico e tens soluções de acesso geral que conseguem, por biometria e/ou CC garantir a presença da uma identificação do próprio.

José Lapalice disse...

2- já expressei o meu entendimento sobre o que para mim é ser secreto.

não sou contra voto electrónico se feito nos locais de voto onde seja verificada a identificação pessoalmente.

ps: eu sou leigo na materia, mas isso de biometria ainda deve ser coisa para actualmente custar um piparote de pasta.

Pedro Antunes disse...

Biometria: O investimento inicial sim, mas o payback em poupança é muito bom. Se a tiveres o controlo pessoal inútil... e mais falível! :)

2. voto secreto é não se saber em que votaste. estamos de acordo com essa definição? :)

José Lapalice disse...

secret ballot - a vote in which each person's choice is secret but the totaled votes are public.

Totaled votes. Not partial votes.

Pedro Antunes disse...

Já agora qual é a fonte?

Um voto secreto é aquele em que ninguém sabe em quem votaste. Se o universo é de 1M ou 10M é um bocado irrelevante, ou não? Explica lá como é que o teu secretismo é reduzido?

Pedro Antunes disse...

até porque não é preciso anunciar quantas pessoas já votaram... simplesmente %, por exemplo, para criar mais uma camada de opacidade face ao voto individual.

José Lapalice disse...

http://www.thefreedictionary.com/secret+ballot

Jose Lapalice disse...

a partir do momento em que antes do fim de um processo eleitoral, se faça qualquer análise dos votos e se disponibilize informação sobre isso, o voto deixa de ser secreto. Para a definição de secreto basta ir ao FLIP. Secreto: Que não é do domínio público. Que não é conhecido.

Pela mesma razão, não são permitidas divulgações de sondagens feitas à boca das urnas (acho que nem é mesmo permitido fazer isso) no dia das eleições.

Pedro Antunes disse...

Lapalice,

Já estamos a discutir semântica, mas de qualquer forma o que seria publicitado seria o agregado e não os votos individuais!

José Lapalice disse...

imagina que tens duas pessoas que vão ver um filme em duas sessões diferentes. no fim da 1ª sessão o tipo diz-te: "epá, aquela cena em que o gajo morre é tramada".

tu quando vais ver o filme, já tens mais informação do que o 1º tinha. sabes que vai morrer alguém. não sabes qual o indivíduo, mas no agregado, sabes que alguém morre.

achas que vais ver o filme da mesma maneira que a 1ª pessoa, ceteris paribus?

Pedro Antunes disse...

Bom, percebo a comparação apesar de considerar que não é de todo correcta.

Claro que se souberes os parciais ao fim do primeiro dia podes querer votar de forma diferente do que se não soubesses. E então? Continua a ser o teu voto, mas com mais informação.

José Lapalice disse...

então, tudo o resto constante, tens votos com diferente grau de informação.

é um sistema assimétrico em si mesmo.

Pedro Antunes disse...

sim. a minha questão é qual o custo e qual o benefício.

nota que só teoricamente é que hoje o sistema não é assimétrico.

José Lapalice disse...

pois, mas o teu sistema é assimétrico logo na teoria.

o custo, é que tu passarias a ter votos que valeriam mais do que outros, tudo o resto constante.

Pedro Antunes disse...

cada voto continuaria a valer um voto.

José Lapalice disse...

não, não teria o mesmo valor.

quando há mesas de voto que por alguma razão estiveram fechadas no dia das eleições, e as pessoas têm de votar noutro dia, pode-se dar o caso dos seus votos poderem literalmente decidir quem ganha. Esse voto vale mais do que os outros votos.

ainda me lembro de ver o Xico Louçã a caçar votos numa freguesia de lisboa cujas urnas não abriram e ele precisava de uma centena de votos mais para ser deputado (antes do BE). Porquê? Porque os votos dessas pessoas valiam muito mais do que os outros votos.

Pedro Antunes disse...

E então? Não é na mesma o voto do povo?

Pedro Antunes disse...

E lapalice, eu não estou a dizer que a minha proposta é ideal ou até melhor. Estou a dizer que me está a ser mais difícil de dizer que não é melhor!

Como eu escrevi, não é óbvio para mim o argumentário contra este modelo.

José Lapalice disse...

se não é óbvio o argumentário é porque temos entendimentos muito diferentes do que é assimetria de informação.

Para alguém tão adepto do liberalismo como dizes ser, acho estranho. Julgava que um liberal seria contra informação assimétrica.

Pedro Antunes disse...

Pois Lapalice, mas para mim não é de todo claro que na prática se gere uma assimetria de informação além da que já existe...

Pedro Antunes disse...

Apesar de me considerar liberal não gosto de me limitar a um rótulo! Permite-me, de vez em quando, ser mais do que um rótulo! Pode ser? :)

José Lapalice disse...

se a pessoa que for votar na 3ª feira, já souber que as pessoas que votaram na 2ª feira votaram maioritariamente no partido x, como é que isso não gera assimetria? (face ao que já existe).

é que sondagem não é o mesmo do resultado parcial de uma votação.

Pedro Antunes disse...

Lapalice,

Eu percebo o teu ponto. A minha questão é se essa assimetria (que eu já disse que pode existir) é de facto um custo, e caso seja que não seja suplantada pelo benefício de ter eleições mais representativas (a minha impressão é que mais pessoas iam votar para reforçar ou contrariar o sentido das parciais).

José Lapalice disse...

queres eleições mais representativas, torna o voto obrigatório e permite votação electrónica não restrita à área de residência.
Não é preciso estar a complicar e inventar. não conheço nenhum país com esse sistema, e não quero que Portugal seja um first mover nesse tipo de experiências.

Paulo Ribeiro disse...

Bem, aqui estou com o Lapalice:
Da mesma maneira que o dia antes das eleições é o dia de reflexão, em que não são permitidas sondagens, e a proibição de campanhas à porta das urnas no dia das eleições, eu não concordo com a divulgação dos resultados parciais das votações por causa da possibilidade de enviesamento dos resultados. O argumento do Pedro que diz que com a divulgação dos resultados parciais as pessoas poderiam ser levadas a ir votar também funciona ao contrário se os resultados forem muito díspares. Além disso, o nosso sistema eleitoral atribui os lugares utilizando o método de D'Hondt (que não é uma divisão aritmética dos votos)e por exemplo no caso da Assembleia, temos os círculos distritais. Parece-me extremamente confuso e contra producente a divulgação dos resultados.
Em relação ao estender as eleições por vários dias, não tenho nada contra isso. Como sou emigrante, estou habituado a votar pelo correio ou no consulado, e no nosso caso o voto não é muito secreto porque temos que enviar uma cópia do cartão de eleitor, se bem que o voto vá no envelope à parte. De qualquer maneira, penso que o voto presencial seja o mais seguro. Penso que haja várias coisas que se podem melhorar no nosso sistema, por exemplo:
a) Uma pessoa devia poder votar em qualquer mesa de voto e não apenas naquela onde está inscrito;
b) Este sistema já permitiria que houvese mesas de voto volantes para por exemplo ir aos hospitais ou lares para recolher votos;

Mas no final, o voto é um direito e um dever e desculpas do tipo: É a um Domingo", "está sol e vamos para a praia", "está frio e a chover" não são aceitáveis. E francamente, se uma pessoa não vai votar porque prefere ir para a praia ou para um centro comercial, nem sequer merece falar nem queixar-se acerca do rumo do país.

Pedro Antunes disse...

Paulo, abstraindo-te da questão do método de Hondt visto que isso pode ser mudado, a minha questão é porque é que leva a confusão e porque é que é contraproducente.

No início da conversa de que falo no meu texto eu tinha uma posição muito semelhante ao Lapalice e à tua. Depois da discussão não tenho tanta certeza.

1. A questão do secretismo do voto pode ser assegurada de imensas maneiras - o anúncio é um agregado, ou podem ser publicadas apenas as percentagens.

2. O enviesamento do voto não é factual. A questão é que quem votasse nos dias seguintes teria a oportunidade de orientar o seu voto de forma diferente. Vamos imaginar que eu não me revejo completamente em nenhum partido e que a minha vontade eleitoral é criar uma maioria limitada para impedir a viabilização de algumas medidas (olhem o caso da independência na Catalunha). No segundo dia via o partido X perto de uma maioria absoluta e vou às urnas votar no Y. Numa votação inicial poderia votar no X por não acreditar na maioria absoluta.

3. E porque é que o enviesamento, se vindo de mais informação, é mau?

Mas eu percebo as vossas críticas. A minha questão é que este assunto não é assim tão claro e para mim obrigar as pessoas a votar abre a discussão de se eu tenho o direito a obrigar todos a votar!

Paulo Ribeiro disse...

Pedro:
Confusão porque as variações diárias podem ser muito grandes (ao contrário das sondagens que são anunciadas quando as urnas fecham). Mesmo abstraindo-nos do método d'Hondt, por exemplo nas eleições da Assembleia tinhas 22 resultados parciais (um por cada círculo eleitoral) por dia de votação. Parece-me confuso.
Contra producente porque a razão pela qual tu sugeriste a mudança de método foi para combater a abstenção. Se um partido está claramente à frente, os potenciais eleitores desse partido que iriam votar poderão não o fazer porque pensam que a eleição está ganha, o que contrabalançaria com a possível mobilização do eleitorado do partido que iria atrás, por isso no fim poderia ser um jogo de soma nula.

Pedro Antunes disse...

Paulo,

A razão que eu dei foi a descredibilização do ato por parte dos "perdedores" - a abstenção é só um dos factores que usam, o ser num domingo ou durante as férias é outro.

A questão da mobilização seria resultado de uma análise de custo/benefício, com a devida ponderação do risco de que falas.

Mas percebo a tua posição, que até partilho em parte. No início da conversa que descrevo no texto, era claro para mim uma posição semelhante à tua. À medida que a mesma foi evoluindo fui ficando com algumas dúvidas e a ideia do meu texto era replicar a discussão aqui e ver como os argumentos eram construídos. Daí a interrogação final.