Fará no próximo dia 4 de Dezembro 30 anos que faleceu Francisco Sá Carneiro. Fundador e um dos ideólogos do PPD/PSD, Sá Carneiro tem sido evocado em nome da Social-democracia, valor que o PSD alega ser detentor e fiel reprodutor.
No entanto, o PSD vive também aprisionado à memória do seu herói. Não é raro ouvir os sociais-democratas a falar em memória desta personalidade e dos seus planos para Portugal. Quando há eleições para presidente do PSD, falar no Dr. Sá Carneiro funciona no PSD como uma espécie de alavanca eleitoral a que os militantes aderem sem vacilar. Nos congressos do PSD temos o mesmo cenário em repetidas intervenções, sempre muito ovacionadas. Sá Carneiro para aqui, Sá Carneiro para ali! E palmas ao orador!
Mais surpreendente ainda é a evocação do Dr. Sá Carneiro em alguns fóruns da Juventude Social Democrata. Dado que já passaram 30 anos desde o trágico “acidente” de aviação, nenhum dos “jotas” conheceu em vida a figura nem as capacidades do seu herói mas, mesmo assim, não é raro que o enunciem em prol da sua carreira partidária e, às vezes mas nem sempre, também politica.
Sá Carneiro consegue, após 30 anos, ser ainda o factor de união do partido, a figura em torno da qual os Sociais-democratas se unem. Diria mais, a única figura de união no PSD. Ter falecido em circunstâncias trágicas tornou Sá Carneiro um ícone que aprisiona o partido às suas características politicas. Ninguém sabe o que teria acontecido se Sá Carneiro não tivesse falecido, como ninguém sabe o que seria de Portugal se D. Sebastião não tivesse desaparecido na batalha de Alcácer Quibir. Mas o partido, com Sá Carneiro e o país com D. Sebastião, têm de soltar as amarras que os prendem a uma memória, uma esperança e a um desejo mas que nunca se tornarão realidades.
O país evoluiu, os desafios são outros, as mentalidades mudaram e os jovens só conhecem Sá Carneiro pela história, pelos discursos e mensagens que o invocam. Sá Carneiro deixará de ser o elixir milagroso que os líderes do PSD utilizam para galvanizar os militantes à medida que a geração de 80 (que não o conheceu) for ganhando peso na sociedade.
O PSD necessita de cortar esse cordão umbilical que, passados 30 anos, ainda tem. Não digo que tem de esquecer um dos seus fundadores mas evocá-lo, só por si, não resolve os problemas. Falar no seu nome deixará de servir para ganhar eleições e será até sinónimo de alguém que ficou refém do passado.
Portugal não pode viver ancorado no sebastianismo e a bem do país, o PSD devia também dar o exemplo e descolar das amarras de uma política do passado e de um líder que pode ter sido o expoente máximo da social-democracia mas que, infelizmente, não pode ajudar para resolver os problemas do presente nem definir a estratégia do futuro.
2 comentários:
É de facto paradigmático o caso do PSD. É que na verdade não tem um, mas dois D. Sebastião.
Um deles, o Sá Carneiro morreu mesmo. O outro está no poder, bem lá no topo, e tem como cognome "o eucalipto". Eucalipto porque seca tudo em seu redor.
Por tudo isto, se já é dificil ao português livrar-se do sebastianismo, para o militante do PPD/PSD desligar-se deste duplo sebastianismo é algo verdadeiramente homérico.
Até porque num passado não muito longínquo outros possiveis Sebastiões vieram à liça: Rui Rio ou António Borges, p.ex..
Quanto ao que actualmente lidera o partido, tendo em conta toda a entourage que o acompanha, não me parece que seja quem vá primar pela originalidade de deixar essas citações galvanizadoras mas que na substância são quase estéreis de tão banais e repetidas.
O mais interessante é que, por exemplo, o PCP, partido aparentemente mais ortodoxo e que teve um líder fortemente carismático (Dr. Álvaro Cunhal), não faz a evocação do seu "heroi" tantas vezes como o PSD o faz!
Morrer em circunstâncias trágicas tem seguramente este efeito nos seus seguidores mas será esse o unico motivo para os partidos não evoluirem face aos mandamentos da história?
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