quarta-feira, 23 de março de 2011

As diferentes velocidades do Alentejo

Pelos dados da Direcção de Prospectiva e Planeamento do Ministério das Finanças, entre 2000 e 2006 a região do Alentejo registou uma tendência de convergência com a média da riqueza nacional (com uma variação positiva no VAB* de 4.3%), o que seriam óptimas notícias!
Mas, se analisarmos a estatística em detalhe, verifica-se que esta convergência foi conseguida à base de um forte decréscimo da população -4.9% e de uma subida dos preços de 4%, uma vez que a produtividade decresceu igualmente 4%.

Ou seja, uma estatística aparentemente simpática pode esconder aspectos muito negativos e gravosos para uma região…



Falar no Alentejo significa uniformizar uma área geográfica de 31.500 m2, com 753.000 habitantes. Há muitos “Alentejos” com diversos níveis de desenvolvimento. Nesta mesma estatística verifica-se que temos um Alentejo Litoral e um Baixo Alentejo em desenvolvimento, impulsionados pela actividade gerada em Sines e Neves Corvo e um Alto Alentejo (representado neste quadro apenas pelo Distrito de Portalegre) e um Alentejo Central (Distrito de Évora) em divergência com percentagens de variação negativa do VAB de -4.9% e de -7.4% respectivamente.
Se isolarmos os valores correspondentes ao Alto Alentejo, o VAB per capita aumentou 3% e o emprego cresceu 2.9% (o que poderiam ser óptimos resultados) mas a população reduziu 7.4% e a produtividade decresceu 7.2%. Aliás, o Alto Alentejo (Distrito de Portalegre) foi a sub-região Alentejana que mais população perdeu em percentagem neste período!

Quando os governantes falam de desenvolvimento regional falam das macro-regiões. Falam de um Alentejo com Sines, com o Aeroporto de Beja, com o Alqueva, com Neves Corvo e com Auto-Estradas que ligam as capitais de Distrito às redes logísticas. Mas a micro-região Alto Alentejo e nomeadamente Portalegre são realidades distintas. A auto-estrada passa em Elvas mas fica demasiado longe da capital de Distrito, as áreas tradicionais como o turismo e artesanato são insuficientes para fixar população e o facto de não existirem investimentos públicos impulsionadores para a região, leva os jovens a procurarem melhores condições de vida noutras regiões do país ou do estrangeiro. A convergência da região com a média do país pode até ser conseguida estatisticamente no curto prazo, pela via do decréscimo populacional, mas isso é também uma ameaça para o futuro da região por não ser sustentável a médio prazo. Nenhum dos grandes projectos previstos no Alentejo até 2030 terá impacto positivo em Portalegre. São eles o aeroporto de Lisboa em Alcochete (com impacto em Vendas Novas e Évora), a expansão do porto de Sines, a ligação ferroviária Sines-Badajoz, as “auto-estradas do mar”, a plataforma logística do Poceirão, a plataforma logística de Elvas/Caia, o caminho-de-ferro de alta velocidade, o IP8 Sines-Andaluzia, o aeroporto de Beja e a rede de rega de Alqueva.

O Alentejo pode estar em convergência mas o Distrito de Portalegre ficou esquecido dos governantes. Fica demasiado longe para ir de fim-de-semana e demasiado perto para criar uma centralidade própria. Não tem ouro, petróleo, portos, aeroportos nem pirites. Pessoas cada vez tem menos e as empresas que subsistem tentam sobreviver nesta dura realidade. Quando os governantes despertarem para este problema, talvez seja tarde demais. Será preciso começar tudo do zero: pessoas, empresas, estratégia e motivação!
Cada um de nós tem a sua responsabilidade própria que será tanto maior quanto a responsabilidade dos cargos ocupados e a capacidade de influência junto de quem decide!

Não deixemos o Alto Alentejo ficar esquecido!


* Valor acrescentado bruto (VAB) é a soma da actividade produtiva, no decurso de um período, para uma determinada região. Resulta da diferença entre o valor da produção e o valor do consumo intermédio, excluindo impostos e subsídios; VAB = PIB – (impostos - subsídios)


Artigo de Nuno Vaz da Silva publicado no Jornal "Alto Alentejo", edição de 3 Novembro de 2010 e que também pode ser lido no blog Deseconomias

2 comentários:

José La Palice disse...

Bem verdade Nuno. O Alto Alentejo é realmente esquecido quando se pensa no Alentejo. Fiquei deveras impressionado com o volume de perda de população ocorrido em apenas 6 anos. E sei que a tendência será para continar nessa trajectória se mudanças fortes não ocorrerem.

Nuno Vaz da Silva disse...

Há muito tempo que insisto nesta mesma tecla mas receio que desde 2006 até 2011 a tendência de perda de população se tenha acentuado ainda mais.
Não há uma estratégia de aumento da população, de criação de empresas, de aumento da produtividade. E quanto menos pessoas, menor a capacidade de influência e maior o potencial de subdesenvolvimento.
Aguardo com expectativa novos dados estatisticos e vou continuar a alertar para este grave problema que poucos ainda definiram como tal!