Preso por ter cão, preso por não ter, ou a esquizofrenia da opinião “pública”.
O “pênalti para as bancadas” do Sr. Presidente da República tem algo de tragicômico, pois profetiza o que a opinião “pública” ridiculariza: ao terminar um mandato, um político fica na miséria.
“Se um ex-político volta a exercer atividade profissional no setor privado, então obviamente que é corrupto: o tráfico de influências irá obrigatoriamente existir quando (enquanto) o seu partido voltar a estar ligado (ficar) no poder.” Lembram-se do que se escreveu acerca de Jorge Coelho?
Concordo que não gostaria de ver um Presidente da República na posição de assalariado de uma empresa privada. Não pelo “raciocínio” acima mas porque considero que seria desprestigiante para as nossas instituições (No entanto, não me repugna que ministros e secretários de estado o façam). Por isso, as nossas leis prevêem que os antigos presidentes tenham direito a um espaço físico, secretária e motorista para poderem continuar a exercer condignamente a sua cidadania. Concordemos ou não com as suas posições, assim o têm feito o Gen. Ramalho Eanes, o Dr. Mário Soares e o Dr. Jorge Sampaio.
A capa do DN de ontem, com o subtítulo “Regalias” é, portanto, um suicídio coletivo. Ao tratarmos esta questão como regalias imerecidas, insinuando-se cleptomania, estamos a afugentar as pessoas mais capazes da política.
Este tipo de remunerações “ex post” é comum noutros cargos públicos que exigem independência e imparcialidade, tais como dirigentes de entidades regulatórias ou diretores de jornais. Infelizmente, também é comum a sua condenação em praça pública.
No primeiro caso, é desejável que as entidades regulatórias setoriais sejam dirigidas por pessoas sérias com conhecimentos específicos da área. Torna-se, portanto, necessário contratar profissionais muitas vezes vindo do sector privado. Mas estas posições são temporárias. Como garantir que este profissional vai ser isento com as empresas que, muito provavelmente, o irão contratar quando terminar o mandato? Continuando a pagar o salário durante dois anos, ficando essa pessoa impedida de exercer atividade profissional nesse setor durante o mesmo período. O mesmo é válido em caso de demissão (voluntária ou não).
No caso de diretores de jornais, este mecanismo permite a um diretor ter a liberdade de expressão necessária numa democracia. (Lembro- me do caso do Sérgio Figueiredo, mas não encontrei nada no estatuto do Jornalista nem na Lei de Imprensa que o referisse. Se alguém tiver a referência...) .
Estes esquemas de incentivos estão mal desenhados? Tem falhas? Então corrijam-se. Mas não linchem quem respeitou as regras do jogo que lhe foram oferecidas.
João Mergulhão
PS: existe uma petição a exigir a demissão do Sr. Presidente da República. Parece que já tem 20.000 assinaturas. Recordo que em 23 de Janeiro de 2011, mais de dois milhões de pessoas assinaram uma petição para que o Prof. Cavaco Silva fosse PR por cinco anos. Mas sobre a democracia destas “assembleias populares” escreverei outro dia...
3 comentários:
Há tantos temas que abordas no texto acerca dos quais não concordo, mas foco-me apenas em duas frases: " Concordo que não gostaria de ver um Presidente da República na posição de assalariado de uma empresa privada. Não pelo “raciocínio” acima mas porque considero que seria desprestigiante para as nossas instituições".
Pessoalmente discordo disto por várias razões. A primeira é a ideia subjacente é a de colocar num altar quem já foi presidente da república. Não vejo de que forma voltar a trabalhar no privado pudesse ser algo que tirasse prestígio.
Segundo a ideia de que trabalhando no privado não se consegue exercer tão bem a sua cidadania. Ajudar a criar postos de trabalho é dos expoentes mais altos de cidadania.
Terceiro é que desprestigiante é ter um PR que está nas funções a título de voluntariado. E não é que ele esteja sem receber o salário por altruísmo e amor ao país. Não, ele não recebe salário porque teve de optar, e as reformas que tem são mais altas do que o salário. Isso sim, é desprestigiante. Não trabalhar no privado.
Concordo inteiramente no que diz respeito a não fazer sentido que um ex-Presidente da República se veja na contingência de procurar um emprego no sector privado. Não votei em 3 dos ex-Presidentes da República, mas não quero ver as pessoas em quem uma maioria dos meus concidadãos depositou a sua confiança exercerem funções que possam menorizar o cargo que antes desempenharam e a relevância que o mesmo tem na nosso democracia.
Dito isto, sou completamente contra subvenções vitalícias e outras mordomias a quem serviu o país no cargo de deputado e que foi pago para o fazer. O cargo de PR é suposto ser desempenhado por alguém com um historial de serviço, público ou privado, não importa, mas na teoria mais em fim de carreira. É quase coroar de um vida. O cargo de deputado pelo contrário é exercido muitas vezes por gente muito jovem, muitas vezes sem qualquer prova dada e que começam a sua carreira por ali, fruto de favores que prestaram aos partidos ou da carreira que tenham feito no mesmo. Nem sequer precisam de ter 35 anos como se dá no caso de um candidato presidencial (se calhar não seria má ideia instituir esse requisito).
E devo também dizer que subscrevo, por muito bem observado, o comentário relativo à petição e aos votos. O PR teve realmente uma observação extremamente infeliz para dizer o mínimo mas petições para o demitir só são lançadas por quem não tem mais nada para fazer e tem ainda menos a noção do ridículo do que a que ele teve no caso concreto.
Miguel de Pompeia
Eu concordo com o artigo do Joao plenamente. Eu acho que em Portugal existe um excesso de diabolizacao dos politicos e que tudo o que se faz é mau.
Mas pensemos no seguinte. Faria sentido algum proibir um cidadao normal de encontrar um emprego melhor noutra empresa ou mesmo noutro país? Claramente, todos estamos contra. Mas entao porque o que é razoável para um cidadao normal é uma maldade incrivel num politico?
Enviar um comentário