terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Estado-nação ou "Estado-empresa"?

As recentes noticias sobre a eventual perda de soberania de alguns Estados em contrapartida da concessão de financiamento externo têm motivado discussões sobre a razoabilidade da medida. Se, para alguns, é admissível e lógico que a gestão de um país seja partilhada com os credores internacionais, para outros é inadmissível que tal aconteça!
Mais do que uma discussão entre devedores e credores ou entre países cumpridores ou incumpridores, trata-se de uma clara divergência entre ideologias opostas. Devemos considerar os países como Estados-Nação ou como “Estados-Empresa”?
O conceito clássico de país aproxima-se da terminologia Estado-nação: um território coeso e com matriz sócio-cultural própria, gerido por um governo. Já um Estado-empresa talvez seja o novo conceito de Nação: um Estado gerido como uma empresa, com cidadãos enquanto accionistas e contas auditadas por entidades externas. Para além disso, a gestão desse Estado poderia ser partilhada com accionistas (não cidadãos) externos. Podemos afirmar que já temos algumas parecenças com esta nova filosofia de Estado-empresa, até porque abdicámos de parte da nossa soberania quando decidimos aderir à União Europeia (e, no que diz respeito à politica monetária quando decidimos aderir à moeda única).
No entanto, numa eventual evolução para Estado-empresa, fará sentido que os credores internacionais fiquem com parte do capital social e tenham assento nos órgãos executivos do próprio Estado? Numa empresa em dificuldades, isso pode acontecer. As instituições financeiras podem financiar as dívidas mas exigem, para além da taxa de rendibilidade, uma parte do capital social…Da mesma forma podemos estender esta dedução lógica aos países em vias de desenvolvimento. Fará sentido que um outro estado financie nações em desenvolvimento numa lógica de capital de risco ou mesmo de business angels?
Estamos a entrar num campo muito sensível. O dinheiro tem um preço e é compreensível que quem o empreste garanta o seu retorno em função do risco. Mas um país não é a mesma coisa do que uma empresa. Em primeiro lugar não tem o lucro como objectivo. Em segundo lugar, a missão de um país é diferente da matriz histórico-cultural que deu origem a essa nação. Em terceiro lugar, os cidadãos só poderiam ter uma acção do capital desse país sob pena de termos cidadãos de 1ª e cidadãos de 2ª. E mesmo que assim fosse, o que sucedia ao recebermos emigrantes? E como se protegiam as minorias e os desfavorecidos?
Um Estado dificilmente será uma empresa mas o conceito Estado-nação está a evoluir. Se a matriz sócio-cultural era o factor mais importante para distinguir os Estados, actualmente começa a ganhar peso a solvabilidade e a capacidade de gestão. Ainda assim, o bom senso deverá prevalecer porque podemos ter Estados em dificuldades, podemos até ter Estados insolventes mas o Estado-empresa é uma utopia supra-liberal que nunca deverá chegar a acontecer!

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