Uma vez disseram-me que quando não se tem dificuldade em adormecer mas se acorda a meio da noite pode ser um sinal de início de depressão. Aconteceu-me isso hoje. O país a cair aos pedaços e eu deprimido. Pensei que as duas coisas podiam estar relacionadas e que tinha mesmo que fazer alguma coisa em relação a esta coisa do “passa não passa o orçamento”.
Pensei em falar com uns amigos e juntar um dinheirito e tal para resolver isto de uma vez por todas. Todos eles me disseram que se o Estado fosse um bom gestor de conta meteriam lá todo o seu dinheiro. Infelizmente, informaram-me que existiam milhares de gestores de conta melhores do que o Estado. Disseram-me maravilhas de um rapaz novo ali para os lados das Torres de Lisboa num balcão do Montepio Geral.
Expliquei-lhes que, na minha opinião a coisa pública (doravante coisa) tem que continuar a existir e a ser gerida. Eles até concordaram comigo. Uns acham que deve existir mais coisa outros acham que deve existir menos. Mas todos concordamos que tem mesmo que existir um mínimo da coisa. Dentro disto comecei a pensar que a maior ameaça à coisa é mesmo a sua má gestão.
Fiquei ainda mais perturbado. Lembrei-me da minha primeira reunião de condomínio. A administração do condomínio era feita por uma empresa para os lados do Calvário. A reunião foi na sede dessa empresa. Logo ao entrar fiquei desconfiado com o ar de ruína do prédio da empresa que administrava o meu prédio. A reunião confirmou os meus piores receios:
As reparações no meu prédio eram feitas não de acordo com a necessidade mas pelo critério do maior valor das obras (10% do valor ficava para a administração). O que sobrava do orçamento era entregue ao amigo da mediadora de seguros e à filha do cunhado da prima da administradora que fazia a limpeza a um preço exorbitante. Para piorar a situação estávamos numa situação de défice e com uma dívida elevada até porque já ninguém queria pagar o condomínio. Ainda consigo ouvir a Dona Laura do 3.º andar nessa reunião a repetir incessantemente que no passado é que as coisas eram bem-feitas e que era sempre a mesma a ser prejudicada.
Já lá vão 5 anos e estamos finalmente a fechar a porta aos problemas que se acumularam nessa altura. Não serve este exemplo para elogiar a administração da qual faço parte ou para partilhar os meus problemas pessoais. É apenas um exemplo da necessidade de gerir com competência e com os incentivos correctos a coisa.
Mas como é que se assegura a gestão adequada dessa coisa?
O mercado. Oferta e procura. Concorrência e tal. Mas isso não é demasiado teórico? É. Mas a teoria pode funcionar.
Imaginem os milhares de jovens competentes e com formação que estão por aí alheados da coisa (normalmente colocados de lado em funções sem real responsabilidade e autonomia – porque na minha opinião esta crise é também uma questão de falta de oportunidade real para as pessoas, sobretudo para os mais jovens. Mas isso dava um outro blog) a filiarem-se em partidos ou a criarem movimentos independentes colocando pressão na proporção de políticos que não tem nem competência nem os incentivos correctos para saber sequer o que é o interesse público. Estou então a falar da expansão da oferta de serviços de gestão da coisa.
Pensem nos milhões de pessoas alheadas do que se passa na governação do país. Aquelas que já desistiram de se interessar com o que se passa desde que não os afecte muito e que só tentam desesperadamente não pagar o "condomínio”. Imaginem esses milhões a passar a intervir socialmente de forma activa: Manifestando-se, reclamando, votando de forma exigente e responsável. A agir e a participar. Ou seja, expansão da procura de serviços com qualidade de gestão da coisa.
Estou certo que as coisas mudariam. Não nos iludamos: Demoraria décadas (se no meu condomínio foram 5 anos!). Seriam precisos sacrifícios e nem tudo seria perfeito. Haveria até muita gente a ficar pior do que está. Mas as coisas (e a coisa) mudariam num sentido correcto e, sobretudo, com uma estratégia coerente e adequada ao país. É teoria eu sei. Ainda por cima estamos a falar de um mercado com imensas barreiras à entrada... Pelo menos para uma entrada eficiente.
Não deixa porém de ser um caminho. Não sei porquê sinto que todos estamos a precisar um pouco de agir e de ter um caminho.
Passem pelo menos a palavra ao tipo novo do Montepio ao pé das Torres de Lisboa.Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se não o fizerem ali?Fernando Pessoa
Pensei em falar com uns amigos e juntar um dinheirito e tal para resolver isto de uma vez por todas. Todos eles me disseram que se o Estado fosse um bom gestor de conta meteriam lá todo o seu dinheiro. Infelizmente, informaram-me que existiam milhares de gestores de conta melhores do que o Estado. Disseram-me maravilhas de um rapaz novo ali para os lados das Torres de Lisboa num balcão do Montepio Geral.
Expliquei-lhes que, na minha opinião a coisa pública (doravante coisa) tem que continuar a existir e a ser gerida. Eles até concordaram comigo. Uns acham que deve existir mais coisa outros acham que deve existir menos. Mas todos concordamos que tem mesmo que existir um mínimo da coisa. Dentro disto comecei a pensar que a maior ameaça à coisa é mesmo a sua má gestão.
Fiquei ainda mais perturbado. Lembrei-me da minha primeira reunião de condomínio. A administração do condomínio era feita por uma empresa para os lados do Calvário. A reunião foi na sede dessa empresa. Logo ao entrar fiquei desconfiado com o ar de ruína do prédio da empresa que administrava o meu prédio. A reunião confirmou os meus piores receios:
As reparações no meu prédio eram feitas não de acordo com a necessidade mas pelo critério do maior valor das obras (10% do valor ficava para a administração). O que sobrava do orçamento era entregue ao amigo da mediadora de seguros e à filha do cunhado da prima da administradora que fazia a limpeza a um preço exorbitante. Para piorar a situação estávamos numa situação de défice e com uma dívida elevada até porque já ninguém queria pagar o condomínio. Ainda consigo ouvir a Dona Laura do 3.º andar nessa reunião a repetir incessantemente que no passado é que as coisas eram bem-feitas e que era sempre a mesma a ser prejudicada.
Já lá vão 5 anos e estamos finalmente a fechar a porta aos problemas que se acumularam nessa altura. Não serve este exemplo para elogiar a administração da qual faço parte ou para partilhar os meus problemas pessoais. É apenas um exemplo da necessidade de gerir com competência e com os incentivos correctos a coisa.
Mas como é que se assegura a gestão adequada dessa coisa?
O mercado. Oferta e procura. Concorrência e tal. Mas isso não é demasiado teórico? É. Mas a teoria pode funcionar.
Imaginem os milhares de jovens competentes e com formação que estão por aí alheados da coisa (normalmente colocados de lado em funções sem real responsabilidade e autonomia – porque na minha opinião esta crise é também uma questão de falta de oportunidade real para as pessoas, sobretudo para os mais jovens. Mas isso dava um outro blog) a filiarem-se em partidos ou a criarem movimentos independentes colocando pressão na proporção de políticos que não tem nem competência nem os incentivos correctos para saber sequer o que é o interesse público. Estou então a falar da expansão da oferta de serviços de gestão da coisa.
Pensem nos milhões de pessoas alheadas do que se passa na governação do país. Aquelas que já desistiram de se interessar com o que se passa desde que não os afecte muito e que só tentam desesperadamente não pagar o "condomínio”. Imaginem esses milhões a passar a intervir socialmente de forma activa: Manifestando-se, reclamando, votando de forma exigente e responsável. A agir e a participar. Ou seja, expansão da procura de serviços com qualidade de gestão da coisa.
Estou certo que as coisas mudariam. Não nos iludamos: Demoraria décadas (se no meu condomínio foram 5 anos!). Seriam precisos sacrifícios e nem tudo seria perfeito. Haveria até muita gente a ficar pior do que está. Mas as coisas (e a coisa) mudariam num sentido correcto e, sobretudo, com uma estratégia coerente e adequada ao país. É teoria eu sei. Ainda por cima estamos a falar de um mercado com imensas barreiras à entrada... Pelo menos para uma entrada eficiente.
Não deixa porém de ser um caminho. Não sei porquê sinto que todos estamos a precisar um pouco de agir e de ter um caminho.
Passem pelo menos a palavra ao tipo novo do Montepio ao pé das Torres de Lisboa.Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se não o fizerem ali?Fernando Pessoa
3 comentários:
Eu sou uma teórica. E concordo com a tua teoria. Mas um exercício aplicado diz-me que os milhões de pessoas alheadas estão mais interessados nos desfechos das n telenovelas da TVI. E vai piorar. Vai piorar porque o nosso sistema de ensino anda a produzir imbecis massivamente.
Concordo com a V. quando ela refere que as pessoas estão alheadas e assim irá continuar e piorar porque de facto continua a apostar-se na estupidificação da população.
Este enorme condomínio que é Portugal não evoluiu praticamente nada em termos de mentalidade nos últimos 150 anos. Já Antero, Eça, Pessoa sabiam muito bem o que valia o português.
Acho que os jovens sofrem na sua maioria de falta de ambição crónica, originada entre outras coisas por famílias super protectoras. Trabalhar e estudar ao mesmo tempo, p.ex. ainda é visto com piedade em Portugal. Conheço muitas pessoas que não têm a mínima noção do que é um negócio privado, pois até terminarem a faculdade nunca trabalharam, e quando começaram a trabalhar foi na função pública. é fundamental incentivar os jovens a serem independentes o mais cedo possivel, só assim poderão sentir-se motivados para participar na sociedade. Por exemplo, não dificultando a vida a quem é trabalhador estudante na universidade, como ocorria na universidade onde eu andei. A palavra de ordem era que queriam estudantes a full-time....
Eu descobri recentemente, no jantar de aniversário de um amigo, que a qualidade (melhor, falta dela) dos alunos do ensino dito superior (e deduzo que dos outros níveis também, mas falo do que conheço melhor) é um óptimo desbloqueador de conversa. Experimenta relatar o caso do aluno que calculou uma taxa de desemprego superior a 100% ou do outro que determinou um consumo público negativo: é êxito garantido entre estranhos! Infelizmente, é um grande fracasso para o país.
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