Publico aqui o meu artigo saído na newsletter da Ordem dos Economistas - Delegação Regional da Madeira deste trimestre:
"[Dizem que quem canta seus males espanta. Imagino que, no Ministério das Finanças, haja muitos males a precisarem de ser espantados. Por isso, deixo uma sugestão musical para cantarem (principalmente, a parte do refrão): http://www.youtube.com/watch?v=QaBZrSy5CWA.]
"[Dizem que quem canta seus males espanta. Imagino que, no Ministério das Finanças, haja muitos males a precisarem de ser espantados. Por isso, deixo uma sugestão musical para cantarem (principalmente, a parte do refrão): http://www.youtube.com/watch?v=QaBZrSy5CWA.]
Depois de, há dois anos e meio,
ter dado dicas nutricionais com um artigo intitulado “A Dieta”, volto ao tema
do emagrecimento, adoptando para título desta reflexão o nome do mais recente
programa televisivo dedicado à perda de peso. É que o paciente não está mais
magro. Perdeu volume, é certo, mas à custa de um regime alimentar que lhe
reduziu a massa muscular.
Deixando-me de metáforas. A
austeridade é necessária. Ou melhor, a austeridade é necessária, se quisermos
continuar a fazer parte da moeda única. Sim, porque há sempre essa solução!
Podemos não cortar nas despesas, podemos continuar a deixar o défice orçamental
crescer; mas, nesse contexto, ninguém nos emprestará dinheiro e, como não temos
o poder de mandar imprimir euros, ver-nos-emos forçados a regressar a uma moeda
nacional. Não sei se se chamaria escudo, como em tempos idos, mas sei que seria
uma moeda altamente desvalorizada, associada a níveis de inflação altíssimos,
prontos a comerem-nos todos os ganhos nominais. Regressando à alegoria: se
alguém quiser emagrecer sem corrigir hábitos alimentares, nem praticar
exercício, pode sempre começar a snifar cocaína, que os números mais pequenos
vão passar a servir-lhe, mas a que preço?! Certamente, um que não queremos
pagar – um que espero que não queiramos pagar!...
Obviamente, quem tem um bom
metabolismo não precisa de se preocupar com o pecado da gula (a não ser, claro
está, por motivos religiosos). Acelerá-lo é coisa que requer tempo, mas um plano
de emagrecimento bem desenhado ajudará a chegar a esse objectivo de longo
prazo. Ou seja: a austeridade, se bem aplicada, conseguirá, não apenas resolver
o problema conjuntural que temos entre mãos (o de controlar e reduzir a dívida
para níveis que nos permitam “servi-la”), mas também lançar as bases para um
futuro crescimento económico assente no aumento da competitividade e
produtividade. Pelo contrário, um mau programa de austeridade delapida
recursos, fazendo-nos entrar num ciclo vicioso.
No passado dia 15 de Setembro,
milhares de portugueses aderiram a um protesto intitulado “Que se lixe a
troika! Queremos as nossas vidas de volta!”. Se a troika “se lixasse para nós”
(ou nós para ela, conforme as perspectivas), não haveria dinheiro para pagar
vencimentos – e convém notar que 0% de vencimento é inferior ao que ficaram os
funcionários públicos[i]
a receber depois de lhes serem retirados os subsídios e feitos demais cortes.
Teríamos de ter abandonado o euro e até poderíamos ter tido aumentos nos
salários nominais, mas os reais seriam imensamente reduzidos. Portanto, cuidado
com aquilo que se deseja… Aliás, convém notar, igualmente, que a nossa dívida
externa não é somente pública. E, por isso, eu sugiro que aos Pais-Nossos e
Avé-Marias de pedido por um país melhor se juntem uns actos de contrição. Mas
isso é tema que daria para todo um outro artigo…
Voltando ao da austeridade. O
trabalho de corte nos consumos intermédios continua por fazer. Ainda ontem
ouvia a história de uma jovem auxiliar de enfermagem sujeita a um protocolo
hospitalar de puro desperdício: imaginem que, quando os comprimidos têm de ser
cortados ao meio por só existirem numa apresentação que tem o dobro da dosagem
prescrita, há uma metade que vai para o lixo. E este é apenas um exemplo, a que
se poderão juntar muitos outros; o das águas engarrafadas para os deputados,
nomeadamente. Centenas de euros aqui, milhares acolá e chega-se aos milhões.
Não serão todos os milhões do buraco orçamental, mas já é qualquer coisa. Um
ano de buscas e só encontraram quatro fundações a merecer a extinção?! O
projecto de reorganização do território, com a fusão de municípios e
freguesias, não passou disso mesmo, de um projecto. E, de resto, a
administração pública continua a funcionar exactamente do mesmo modo, com as
mesmas ineficiências e os mesmos vícios.
Toda a redução de despesa pública
que serviu de slogan em campanhas eleitorais está por fazer. E é essa
austeridade que devemos exigir. Aproveitando a embalagem, peçamos também as
reformas da educação e da justiça, cruciais para aumentar o potencial de
crescimento do país. Para os nossos decisores políticos, uma mensagem: toca a
mexer (que há muito para fazer)!
[i]
Utilizo aqui o termo funcionário público no sentido lato de quem tem uma
relação de emprego público."
3 comentários:
Olá Vera,
Concordo que é importante procurar formas de reduzir a despesa com o dobro da energia com que se procura aumentar a receita fiscal. Investigação do Alberto Alesina e da Silvia Ardagna (http://www.nber.org/papers/w18423) indica claramente que a austeridade do lado da desepesa é muito menos nefasta para o crescimento e pode mesmo ser "expansiva".
Discordo quando dizes que a alternativa à austeridade é a saída do euro... A saída do euro provavelmente aumentaria ainda mais a urgência de realizar a austeridade... ou como é que os bancos endividados conseguiriam pagar as suas dívidas com um escudo desvalorizado em 25%...? e seria necessário provavelmente outro bail out, pouco benéfico para as finanças públicos.
Acho portanto que permanecer no euro é a única alternativa válida... Mas como tu sugeres há várias austeridades possíveis... e aumentar os impostos à classe média com maior propensão marginal ao consumo em plena recessão é julgo a solução errada.
Em vez, seria melhor procurar diminuir a despesa e aumentar os impostos sobre os mais ricos tornando o sistema fiscal mais progressivo. E claro, negociar enérgicamente com a troika melhores condições na ajuda prestada pelos nossos parceiros da UE.
Paulo, se calhar não fui clara (?!), mas eu advogo a saída do euro como resolução dos nossos problemas tanto quanto prescrevo linhas de coca pelas narinas dentro para emagrecer!
Sim, sim, comprendi que não recomendas essa alternativa porque os custos seriam elevados... Mas é que eu acho que até os "benefícios" da saída não são claros. É que até como "cura de emagrecimento" a cocaina é capaz de não ser eficaz. A dívida real quase de certeza que engordava ;)
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