Muitas
vezes discutimos a pobreza portuguesa em recursos naturais, nomeadamente os
escassos recursos energéticos como o petróleo.
Todavia, a verdade é que no mundo existem poucos países que se desenvolveram
exclusivamente com base nos seus recursos naturais. Basta verificar que o
sector primário (incluindo agricultura, minaria, e exploraçao energética) tem
representado uma proporçao decrescente das grandes economias desenvolvidas,
como EUA, Alemanha, França, Japao, e Reino Unido. Ainda que o carvao e petróleo
tenham sido componentes importantes do seu desenvolvimento durante o século 19,
a sua importancia é hoje bem menor.
É certo que alguns países hoje, como Qatar, Noruega ou Arábia Saudita, que
devem muito da sua riqueza ao petróleo. Todavia, muitos dos países ricos em
petróleo beneficiam nao só de um grande jazigo petrolífero, mas também de uma
pequena populaçao que partilha esse valioso recurso.
Eu decidi fazer uma breve análise para ilustrar este ponto. Retirando dados
(todos do wikipedia) calculei o óleo per capita existente em países como
Venezuela, Arabia Saudita, Noruega, Kuwait, e Qatar. Mas em seguida tomo em
conta que Portugal tem uma densidade populacional diferente destes países e que
portanto esta riqueza petrolifera no caso português seria dividida por um
número de pessoas diferente. Assim, Portugal tem uma densidade populacional 3.8
vezes superior à da Venezuela, 8.8 vezes a da Arábia Saudita, e 7.4 vezes a da
Noruega. Isto indica que se descobrissemos em Portugal uma riqueza petrolífera
por área similar a estes países teriamos de repartir a riqueza por muitas mais
pessoas e o efeito no nosso PIB per capita seria bem reduzido. Uma descoberta
petrolífera igual à da Arábia Saudita só iria aumentar o nosso PIB em 5.1%, o
que seria apenas o suficiente para alcançarmos a Eslovénia e outros países
pouco mais desenvolvidos que nós. Petróleo ajudaria Portugal, mas nao nos
igualaria à Alemanha.
Venezuela
|
Saudi Arabia
|
Norway
|
Kuwait
|
Qatar
|
|
Oil
share in GDP
|
34%
|
45%
|
21%
|
48%
|
61%
|
GDP
per capita
|
22,635
|
98,329
|
|||
oil
per capita
|
3,607
|
10,186
|
20,423
|
23,031
|
59,981
|
persons
per square km
|
30.2
|
13
|
15.5
|
200.2
|
123.2
|
|
Portugal
|
||||
persons
per sq km
|
115
|
115
|
115
|
115
|
115
|
ratio
of persons per sq km
|
3.8
|
8.8
|
7.4
|
0.6
|
0.9
|
oil
per citizen
|
947
|
1,151
|
2,753
|
40,095
|
64,258
|
GDP
per capita
|
22,413
|
22,413
|
22,413
|
||
GDP increase of oil discovery
|
4.2%
|
5.1%
|
12.3%
|
178.9%
|
286.7%
|
Esta simples análise revela que é impossivel alguma vez desenvolvermos-nos
por uma descoberta inesperada de recursos naturais. A única forma de
enriquecermos substancialmente com petróleo seria com jazigos similares aos do
Kuwait e Qatar, mas obviamente esses jazigos nao existem no nosso país. Uma
descoberta de recursos naturais em solo português no futuro seria certamente de
valor bem inferior à da Venezuela, logo de impacto reduzido no nosso PIB per
capita.
Mas gostaria de chamar a atençao que temos um recurso natural bem à vista
de todos e ainda por explorar completamente, a beleza das nossas cidades e a
sua pequena dimensao. Um artigo recente do The Economist explica que as cidades europeias sao bem mais pequenas que as americanas.
A pequena dimensao das cidades europeias impede-as de aproveitar economias de
escala nas redes de transporte (como o metro e outras infraestruturas
existentes nas cidades grandes) e comunicaçao de ideias. Um estudo estatístico
da McKinsey indica que a menor dimensao das cidades europeias pode implicar uma
reduçao de 21% no PIB per capita da Europa em relaçao aos EUA.
Um artigo do economista Olivier Blanchard no Portuguese Economic Journal de 2007 também incide sobre este problema
no caso específico de Portugal. A secçao 3 do artigo acerca de como melhorar a
produtividade portuguesa é para mim a mais interessante. Blanchard menciona
realmente que um dos problemas de Portugal é levantar demasiados obstáculos à
construçao de novos empreendimentos urbanos. Portugal poderia ser uma
alternativa atraente de localizaçao para reformados de toda a Europa
aproveitarem a nossa Costa e Sol, tal como a Florida (uma zona de casinos, praias
e pantânos) o é nos EUA. Mas vários bloqueios existem para esta estratégia de
desenvolvimento: 1) a necessidade de flexibilizar a contrataçao laboral (de
forma a permitir às empresas ser mais flexiveis durante períodos sazonais e com
maior procura de serviços); 2) um serviço de saúde mais flexivel e eficiente
(esperemos que isto ocorra com a nova regulaçao europeia dos mercados de saúde);
3) restriçoes severas à construçao, em particular de novos empreendimentos de
média e grande dimensao (restriçoes que segundo Blanchard sao bem piores que as
da Holanda); e 4) o favorecimento de pequenas empresas
imobiliárias em vez de companhias mais eficientes.
Ademais destes pontos, grande parte da ineficiencia da administraçao
pública se deve às pequenas povoaçoes de Portugal e aos bloqueios à construçao
nas cidades. Muitos dos casos de corrupçao que se reportam dizem a respeito a
casos de licenças de urbanizaçao e seriam problemas menores num país onde a
construçao é mais livre. Outra ineficiencia pública criada por um excesso de povoacao no mundo rural
é depois termos muitas escolas e centros de saúde destinados a servir um
pequeno número de famílias, algo que iria lentamente desaparecer se as nossas
cidades crescessem mais. O crescimento de novos empreendimentos empresariais
também aumenta a eficiencia e concorrencia no sector privado.
Claro, existe um bloqueio muito forte à liberalizaçao da expansao urbana e
esse é o voto dos residentes proprietários. As restriçoes urbanas – feitas em
nome da proteçao do carácter dos bairros, entre outras coisas – aumentam o
preço das casas e beneficiam os actuais proprietários. Assim parece que o
principal obstáculo ao nosso desenvolvimento é uma falta de solidariedade geracional.
Os proprietários antigos têm de permitir a construçao de casas e empresas que
beneficiem as novas geraçoes.
Carlos
Madeira
Economista do Banco Central do
Chile
O artigo reflecta meramente a
opiniao pessoal do seu autor.
4 comentários:
As restrições à construção de empreendimentos turísticos ou residenciais são para grandes e pequenos promotores.
Só para exemplificar, um dos maiores promotores imobiliários de Portugal levou 10 anos para ter um campo de golfe aprovado.
Um dos pontos fundamentais para poder atrair os reformados europeus para Portugal é o sistema fiscal. E se alguma coisa foi feita no último ano e se prevê para os próximos é um agravamento da carga fiscal para os residentes estrangeiros em Portugal.
Além disso, as ligações aéreas a Portugal ainda são pobres. É inaceitável que Lisboa continue sem ligações via Ryanair por exemplo.
As dificuldades de grandes empreendimentos em Portugal (como o caso desse campo de golf) sao mais severas que em outros países. É exactamente isso o que eu digo no texto e o que é afirmado por Blanchard.
Em relacao às taxas de imposto nao acredito que sejam um grande problema para atrair reformados. Os reformados podem passar até 5 meses por ano em Portugal e continuar pagando impostos nos seus países. Até podem mesmo passar o ano inteiro em Portugal e seguir pagando impostos nos países de origem desde que nao vendam as suas residencias e continuem pagando impostos pela internet. A vigilancia da residencia efectiva de uma pessoa no exterior é muito fraca, logo tu podes passar uma vida inteira fora do país sem que o fisco se aperceba.
O modelo da Florida tem como factor distintivo os incentivos fiscais que são dados aos reformados.
Além disso, julgo que a maioria só tem uma residência, a que está na Florida.
Por outro lado, propostas ilegais para pagar menos impostos são válidas como tantas outras, mas não me parece que vá ser desta forma que o Estado vá promover o destino Portugal como bom para os reformados. " venha para Portugal porque nós temos uma vigilância de residência efectiva fraca" não me parece que daria um bom slogan.
Fica aqui um link de um artigo de jornal sobre a política de impostos para estrangeiros que Portugal quer seguir: http://www.dinheirovivo.pt/Economia/Artigo/CIECO047009.html?page=0 .
E não é só o imposto sobre os rendimentos. Os aumentos brutais de IMI que aí virão, não trarão mais reformados a Portugal com certeza.
Isto de olhar para o passado como solução para o futuro de Portugal não é boa ideia. Os campos de golf sao um desastre ambiental e consomem agua catastroficamente, alias Espanha já está a pagar esse preço e no futuro a agua será o bem mais precioso, enquanto o petroleo cairá em "lixo".Temos toda a energia que precisamos no mar e no sol, agora há que pensar, estudar, criar inovar e o Português aprendeu só a copiar... Mas ou trabalha e exige mais de si próprio, ou afunda-se num ocidente decadente!
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